A CURA E O DESEJO DA ALMA
Não existe nenhum indício de cura na totalidade vital de um indivíduo que já não exista de antemão como uma forte potencialidade para tal acontecimento, ou seja, o caminho para o tornar-se são na vida de um ser humano depende de alguma maneira de uma profunda motivação para uma transformação interior, sem o qual qualquer ajuda de outrem se torna ineficaz e insipiente. Se eu posso fazer algo na vida de alguém e se nesse trabalho houver grandes progressos, é porque já existe em tal ser uma tendência para mobilizar suas próprias forças em prol de sua própria reestruturação, cujo destino é o autoconhecimento, a autonomia e a reabilitação de sua saúde em todos os sentidos possíveis. Qualquer relação terapêutica só consegue se sustentar através da ajuda do diálogo que, de forma marcante, abre um caminho de compreensão mútua, de confiança e de responsabilidade como forte inspiração à liberdade. Ora, sem tal responsabilidade no sentido de disciplina e parcimônia, qualquer autonomia individual se torna bastante prejudicada e obliterada na sua essência, bem como fadado ao fracasso qualquer progresso terapêutico, progresso esse que sempre vai necessitar do comprometimento de ambas as partes. Somente assim os seus bons resultados podem vir a se frutificar. Já dizia Sêneca na sua proposta estoica que é parte da cura o desejo de ser curado. Tal sentença, filosófica por excelência, abre uma perspectiva para o nosso tempo onde as ciências médicas e psicológicas se desenvolverem com o objetivo de contribuir justamente para a promoção da cura da alma. Toda cura abarca tanto o visível, como os aspectos mais invisíveis do ser humano, aqueles aspectos que entendemos como a manifestação anímica de um ser. Toda cura que faz jus ao seu potencial precisa se atentar para os aspectos fisiológicos e comportamentais de uma vida e, se não bastasse, de forma um tanto cuidadosa, abranger também as regiões mais remotas da espiritualidade humana.