O Telhado
A vida é muito engraçada mesmo, mas às vezes ela chega a ser trágica.
Dizem que isso depende de como você encara a vida.
O problema é que ela (a vida) nos engana ou talvez nós mesmo nos enganamos.
Imagine como se a vida fosse uma casa, ou melhor, a sua casa, a sua residência, o seu abrigo.
Ali você tem o que mais lhe agrada; ali você também precisa fazer as faxinas periódicas, as arrumações diárias, etc.
A casa lhe dá segurança, lhe protege do frio e da chuva. É ali que você corre no final de um dia de trabalho árduo, que você relaxa, que você descansa.
A estrutura dessa casa lhe faz crer que está seguro das intempéries; parece que ela é muito forte, muito firme.
Mas, de repente, sem que você espere, uma tempestade chega trazendo consigo um forte vendaval, um furacão.
Então, sem qualquer dó, ela toma conta de todo seu redor. Não dá tempo de correr, não dá tempo nem de fechar as suas janelas.
Aí passa pela sua cabeça, como uma justificativa por ter sido pego de surpresa: “A previsão do tempo não me alertou sobre essa tempestade. Eu não vi nenhum sinal que ela estava chegando”
Como um abraço, só que sem nenhum carinho, todo esse turbilhão envolve sua “casa”. Você ali, parado, impotente, sem conseguir segurar tudo que o vendaval arranca de você.
Você planeja mil ações para tentar conter essa tempestade, tentar evitar a destruição, tentar minimizar a devastação que você sabe que vai acontecer.
Então você percebe sua total impotência, percebe que não há nada mais o que fazer.
Culpa por não ter prestado mais atenção ao tempo, por não ter olhado mais para o céu para ver se haviam nuvens chegando, por não ter imaginado que um dia a calmaria poderia ser abalado por forte ventos.
Ainda bem que o alicerce dessa casa foi edificado sobre a rocha da honestidade, do amor verdadeiro, da entrega de corpo e alma, do companheirismo.
Você vê agora todo o seu jardim desarrumado pelo vento que carrega consigo um cheiro forte de indiferença, raiva, desprezo. Trás também pedaços de insegurança que lhe atingem com força machucando seu corpo, mas principalmente, seu espírito.
Suas janelas e suas portas balançam, tremem, batem e são as primeiras a serem arrancadas.
Até que o seu telhado é arrancado telha a telha. Toda sua cobertura indo embora, expondo tudo que você guardou durante anos dentro da sua casa.
Ventos, chuva, granizo... Tudo de uma só vez!
Apesar de essa tempestade ser rápida e passageira, parece que nunca mais terá fim; ela foi arrasadora.
Levou à força o que você achava que era mais importante; arrancou de você o que era essencial para sua existência. Levo embora o seu telhado.
E agora? Como sobreviverá sem o seu telhado?
Agora a chuva e o vento foram embora. Você não tem para onde ir, por isso continua ali, em sua casa semi destruída, sem portas, sem janelas, sem telhado.
Os planos são reconstruir, mas você não tem forças para começar. Você circula pelos escombros buscando por algo que nem sabe o que é. Qualquer resquício, quaisquer lembranças...
A noite chega, você quer descansar. Mas onde poderia deitar o seu corpo dolorido, diante de tantos pedaços que estão espalhados no chão?
Mesmo assim você deita, desconfortável. O sono não vem, mas o medo, a insegurança, a solidão estão acordados com você. Sua única companhia.
De repente, você percebe que sem o telhado, agora você pode ver as estrelas.
Aquele mesmo telhado que era pra você a sua proteção, lhe impedia de ver quanta beleza existia ali fora.
Isso lhe alegra e faz você querer ver mais. As estrelas, a lua, as nuvens, a brisa.
O telhado deve ser reconstruído, pois haverá ainda dias chuvosos, dias gelados, mas dessa vez, deixe algumas frestas para que a luz da lua e a luz das estrelas possam entrar em sua casa.
Reconstrua!