Sem tempo a perder
A vida não é tão curta quanto parece pela correria desenfreada a qual nos entregamos todos os dias sedentos por atingirmos as metas de uma sociedade baseada sobre um capitalismo selvagem. Mas a vida também não é tão esparsa quanto desejaríamos para que vivamos de forma inconsequente. Como diria Sêneca, “a vida é suficiente”, mas será que nós somos suficientes para a vida?
E quando faço essa pergunta é num sentido bastante aberto para que possamos olhar para o maior número possível de contextos das nossas vidas. Desde os nossos relacionamentos com as outras pessoas, passando pelo tempo que empregamos na criação de alguma coisa e chegando aos períodos que dedicamos ao nosso próprio cuidado. Será que vivemos sabiamente? Ou será que nos resumimos a meros respondentes ao ambiente? Apenas cumprindo regras. Atingindo metas. Fazendo aquilo que esperam que façamos. Ou será que estamos conscientes da nossa existência e existindo como gostaríamos?
Digo isso porque em relação a viver não há tempo a perder. E quando digo isso é me referindo ao que mais precioso possa existir na nossa história. Você consegue desenvolver relacionamentos amorosos baseado na sabedoria? Ou será que se deixa levar por coisas pequenas e passa dias “estranhado” com a pessoa que diz amar? Não há tempo a perder quando o assunto é amor. Porque lá na frente, quando o adeus tiver que ser dado, esse tempo de “estranhamento”, ignorantemente desperdiçado, fará uma dolorosa falta.
Mas também me refiro a tantos outros relacionamentos. Qual a qualidade das nossas relações com nossos amigos, com os nossos filhos, com as pessoas que importam de verdade? É um tempo verdadeiro? Que faz sentido? Capaz de fazer a diferença? Ou é um tempo superficial? Apenas para cumprir metas, como aquelas visitinhas corriqueiras que fazemos na casa de nossos pais apenas para que não digam que foram abandonados? Dedicamos um tempo saudável às pessoas que são especiais? Um tempo de trocas honestas? Um tempo para a construção de memórias que lá na frente, quando o adeus tiver que ser dado, servirão de consolo quando a saudade doer? Nos nossos relacionamentos com as pessoas que importam não há tempo a perder.
E também me refiro ao tempo que dedicamos a nós mesmos. Não é egoísmo. Não é mesquinharia. Amor próprio nunca poderá ser visto de uma maneira pejorativa. Porque ele não é supérfluo. Ele é uma necessidade. Você se cuida? Consegue se olhar no espelho e sentir orgulho de quem é? Ou será que evita esses momentos de encontro consigo mesmo e quando precisa pentear os cabelos ou fazer a barba é sempre com uma pressa para que a imagem ali refletida deixe de ser vista? Muitos de nós estão se odiando. Muitos de nós estão desgostosos consigo mesmos. Porque não dedicam um tempo para o autocuidado, para o autoconhecimento, para que estejam consigo mesmos, conectados com a sua essência, ouvindo a sua própria voz. E esse tempo fará falta quando, em nossos últimos momentos, prestes a darmos adeus para nós mesmos, percebermos que desperdiçamos a vida que tivemos. Em relação ao relacionamento que vivemos conosco mesmos não há tempo a perder.
O que quero dizer é que quando estamos falando de coisas importantes, não há tempo a perder, mas isso é o que mais fazemos: superestimamos o banal e negligenciamos o fundamental. Que ao olhar a se entregar à vida, a gente consiga entender que quando o assunto é viver e existir, com tudo o que isso implica, não há tempo a perder.
(Texto de @Amilton.Jnior)