Frenesi

Desperto de sonhos confusos, consciência enevoada pelo abrupto abrir de olhos, o coração descompassado pelo susto, o baque da alma retornando antes do amanhecer. Na escuridão me encontro, um reflexo do vazio em minha mente, engrenagens rodando furiosas, processando diversas informações. Assim como o preto é a mistura de todas as cores, não no pigmento de luz, onde todas as cores refletidas resultam em branco, mas a cor bruta, mistura de tinta, vários tons de uma coisa só. Assim é o buraco negro em minha mente, tantas informações misturadas, bagunçadas, formando um monte de nada. O pensamento desponta em lágrimas, lateja na fronte, acúmulo de cansaço, de informações, bagagem, dor. Deslizo da cama e vou cambaleante até o banheiro, caminho conhecido no automático por meus pés descalços, o chão limpo e frio contrastando com o calor da minha pele. Paro em frente ao espelho e o frenesi em meu coração para, aperta, sufoca, não reconheço aquele rosto, as olheiras sob os olhos castanhos, o olhar fosco e vazio de quem vendeu a alma. Ouço um soluço que deveria ser meu, as lágrimas manchando a pele branca escorrem como um rio violento, torrente alimentada pela tempestade de sentimentos confusos. Abandono o fantasma refletido no espelho e vou até a escrivaninha. Vinte miligramas para dormir. Volto a deitar e a cama roda, a sensação é mais como estar tentando dormir no olho de um furacão. Mas o furacão sou eu. Abraço o travesseiro como a um pedaço de madeira à deriva. Adormeço entre os fios da teia de uma aranha, casulo indolor e químico, dopante sinistro, apagando o tremor.