Parte do livro NTPUPS
De repente me vi atuando outra vez, vítima da minha própria tragédia, eu era o retrato da " pobre menima rica". Vivendo da ausência do pai falecido e presa a uma mãe narcisista e controladora.
Eu tinha absolutamente tudo! Dinheiro, uma boa posição social, amigos e ainda assim não conseguia me livrar da sensação de ter sido escalada para esse papel a força, senti que haviam escrito o roteiro da minha vida antes mesmo de eu estar consciente pra opinar.
No canto do salão, eu encarava sorrindo uma dezena de estranhos da minha classe, um olho na dança e o outro no copo do cavalheiro a minha direita, pensei comigo mesma, é claro! Ele também está a interpretar.
Então comecei a divagar alucinando na minha fantasia secreta. Éramos só eu e minha mente, um momento de quietude e desatenção.
Era uma vez um homem de bem, sua esposa e filhos o esperavam ansiosos, escutando com cuidado cada pequeno barulho do lado de fora do quintal, até por fim o avistarem ali na porta. Simultaneamente, as crianças correram ao seu entorno, saltitando a sua frente, um beijo lhe imploravam, porem o cansaço e a decepção de ser somente aquilo lhe assombrava. Eu sou pai, sou marido. Quem sou eu? O homem questionava, mas a resposta sempre desencontrava o seu espírito.
Ele veio para aquela festa arrastado, até certo ponto tinhamos algo em comum.
Sua mulher e filhos o deixaram ali sentado e o mesmo pediu ao garçom um copo de whisky, acho que é isso que os homens bebem.
Lá estava ele então, a algumas poucas horas, interpretando ao meu lado. Sem beber uma única gota sequer, tilhintava o copo centímetros da mesa, depois tornava o pousar outra vez, encarando o salão lotado, esperava mais alguns segundos e o tornava a agarrar com mão. Aquela cena se estendeu por toda a noite, e eu ali, pensando quando ele dar se ia conta de que aquilo não estava certo, talvez nunca, pensei de imediato. Talvez nunca.
Por fim, ele se levantou, apertou um sorriso fúnebre e foi ao encontro de sua família, o copo ficou lá, cheio, e o homem eu vi desaparecer dos meus olhos, vazio.