Nº12 - Agridoce
-E o sapinho?
-Faz uhn ahn unh
Memória besta, né?
Mas é essa que vai ficar marcada. Você me fez essa pergunta despretensiosa enquanto eu tomava café na sua casa, olhando pro nada, tentando acordar. Ainda sonhava com nós dois na cama e ainda estava seminua, me preparando pra aceitar o dia longo que viria.
Você quebrou o gelo. Eu ri, você riu, o sapinho ficou. Virou piada interna de nós dois, coisas assim, que a gente não explica, que a gente acha bobo e no final das contas viram as recordações mais doloridas. Uma dorzinha agridoce, no mesmo tempo que enche os olhos d'água, arranca um sorriso no cantinho da boca. Todo mundo tem uma recordação assim.
Com o tempo, dizem que costuma passar. Mas ainda possuo recordações agridoces anteriores. Elas tem uma força imensa, parece que o tempo se congela nesse instante e a memória é gravada como tatuagem. São os piores tipos de lembrança. São essas que nos fazem sair por aí numa sexta-feira à noite e encher o saco do garçom. São essas que nos acordam com um soco na boca do estômago no sábado de manhã ou que nos pegam no meio de um domingo cinzento.
A minha é essa.
Pior, da última vez que transamos, lembro de ver você sorrir e não aguentei:
-O sapinho?
Você riu alto e eu soube que a lembrança besta tinha se eternizado mais uma vez. Agora, na sua memória.
Hoje tô aqui, escrevendo versos no metrô, ainda tentando descobrir que gosto tem o amor.