Sem filtros

Desde que a Internet ganhou força e as redes sociais dominaram o ambiente virtual, os aplicativos e programas de edição de fotos também ganharam notoriedade e milhões de adeptos ao redor do mundo. Aliás, hoje em dia as próprias redes sociais possuem mecanismos de filtros para que possamos colocar em nossas fotos antes de publicá-las. As máscaras já existiam, mas agora elas estão bem mais comuns. O triste é que estamos nos relacionando com personagens e não com pessoas reais, porque na vida de verdade ninguém é tão sorridente o tempo todo, nem tão seguro de si quanto gostaria, todos enfrentamos uma luta interior que tentamos a todo custo esconder.

E fazemos isso, fingimos ser o que não somos, pelo prazer de sermos aceitos. E isso é compreensível. Nós somos seres gregários, ou seja, adoramos conviver e crescer em grupos, aliás, se não fosse a nossa forma de vida coletiva dificilmente teríamos vivido para acompanhar a evolução de nossa própria espécie. E para estarmos dentro de algum grupo a gente precisa ser aceito, e para sermos aceitos nós precisamos de características, gostos e perspectivas em comum. Mas até onde isso é aceitável? Até o limite que nos permite ser autênticos. Quando passa disso e precisamos incansavelmente vestir uma roupagem que não nos serve, aí surge o problema.

E com as facilidades da Internet, com o desejo suscitado por ser seguido e ter influência por sobre as pessoas, os sujeitos disfarçam suas “imperfeições”, escondem suas inseguranças, camuflam sua timidez. Afinal, quem é que quer seguir alguém que apenas reflete os seus próprios medos, desgostos, aquilo que não gosta de ver em si? As pessoas querem acompanhar aqueles que acreditam serem os seus opostos – ou, aqueles a quem gostariam de se assemelhar. Querem acompanhar os corajosos, os fortes, os espontâneos, os felizes. As pessoas se esquecem de que na tela de um celular, atrás de um perfil de rede social, o que existe são personagens. Ninguém, em sã consciência, irá colocar a sua vida completa ali. Colocará o que acha legal de ser colocado. Colocará aquilo que lhe dá orgulho. Colocará o que o fará ser reconhecido, curtido e repercutido. E assim somos levados a pensar que aquilo é a vida, aquilo é ser feliz, aquilo é ter plenitude.

Mas o que é a vida? O que é a felicidade? E o que é a plenitude? Para essas perguntas o que existem são respostas subjetivas, íntimas, pessoais de cada um. Portanto, a vida, para mim, pode ter um significado completamente diferente do seu, talvez eu pense que vida é ter a chance de existir. O mesmo vale para a felicidade. Talvez ler um livro de mil páginas seja algo que me deixe extremamente feliz, mas que deixe outra pessoa em um marasmo tedioso. E em relação à plenitude? O que é ser pleno? É possível o ser o tempo todo? É claro que não. Não seremos plenos sempre. Passaremos por adversidades e seremos confrontados por desequilíbrios. Então a ideia de plenitude é apenas uma mentira que vende bastante e faz as pessoas procurarem por ela na aquisição de uma casa nova, de um carro recém-lançado, de um corpo escultural. Tudo isso é válido para quem o deseja porque enxerga algum sentido. Mas é insatisfatório para quem só o persegue porque pensa que ali encontrará um significado para a própria existência.

Daí a importância de nos conhecermos e reconhecermos. Sem filtros nem roupagens. Que possamos ser nós mesmos, autênticos, genuínos, verdadeiros. E que possamos nos orgulhar da nossa verdade. Nós somos únicos e isso nos torna ímpares. Não precisamos imitar ninguém para sermos felizes, para termos uma vida boa, para sentirmos alguma satisfação. A gente só precisa se conhecer e reconhecer para que saibamos o que nos agrada e atrai e entendamos por onde é que devemos buscar pelo prazer de existir. E a aceitação das outras pessoas só é verdadeira quando elas nos aceitam como somos, sem tentar nos moldar aos seus moldes, sem tentar nos encaixar em suas caixas, respeitando a nossa singularidade. Mas antes disso acontecer você precisa se aceitar, sem se impor a desafios irracionais, sem tentar caber em lugares que não lhe cabem, respeitando os seus limites e a sua particular essência!

(Texto de @Amilton.Jnior)