UMA VOZ ME CHAMA

Corro desajeitado pelas ruas do bairro sem imaginar que o mundo pode se transformar.

Sou apenas um menino bobinho acostumado a não ter as coisas que tanto desejo.

Vou para a escola onde o regime disciplinar é rígido junto com meus irmãos.

Tenho medo da morte, imagino ser uma coisa terrível, mas faço de conta que ela não existe.

Ouço uma voz que me chama, que tenta contactar comigo, mas não vejo ninguém.

Essa voz será a morte? Não sei, mortos não falam e ponho essa ideia de lado.

Passa o tempo, agora sou um rapaz, mudei de bairro, vou para outra escola onde o regime de ensino é de boa qualidade.

Novos amigos, novos divertimentos, novos sonhos, tudo parece ser fantasioso.

Novamente aquela voz me chama e eu fico imaginando quem possa ser e o que deseja.

Começo a ficar preocupado, afinal já tenho consciência da realidade, já sou um rapaz que dentro de pouco tempo serei um adulto.

Festinhas, praia, cinema, viagens, tudo isso me encanta e me faz entrar num mundo diferente.

Consegui um trabalho, minha vida mudou, já tenho dinheiro para comprar o que desejar.

Lá vem aquela voz novamente a me importunar, ainda bem que não me traz problema algum.

Nem sei se devo lhe dar mais atenção, não deve pertencer a nenhum ser vivente.

Continuo meu rumo pela estrada da vida, ela é bela, simples e me deixa bastante feliz.

Já passei dos vinte anos, sou um homem prestes a mudar de vida, a ser um dono de casa.

Mais uma vez a voz a me chamar sem no entanto dizer o que quer, mas já se tornou um fato normal prá mim.

Namorei, casei, tenho filhos, minha esposa é uma pessoa legal e nossas vidas vão de vento em popa.

No trabalho tudo bem, primeiro e único, filhos trabalhando, netos chegando e a felicidade reinando.

Mais uma etapa de tempo cumprida, mais prazeres na vida, chega então a aposentadoria, novos rumos.

Ah! Aquela voz que me chamava voltou a me chamar e eu descobri de quem era. Era a voz da razão.