Porque escrevo?
Das letras uma garotinha se fez em sua estranha infância. Se apegou a um caderno de dois reais e o preencheu com amor, raiva, dores. Essências.
Das letras uma jovem se fez em sua estranha juventude. Passou a escrever sobre a vida que pouco conhecia, ansiando por conhecê-la, temendo detesta-la.
A verdade é que das letras se fez muitas lágrimas, como das lágrimas muitas letras se fizeram. Do amor se fez poesia e da dor se extraiu um verso. Os versos compuseram a vida que ainda se encontra sem definição.
Das letras se faz uma mulher em sua estranha adultez. Passou a escrever sobre dor, medo, perdas. Das letras se expeliu o pranto. Duro, agressivo, maduro.
Das letras surgiram a liberdade de se gritar mulher. Se gritou menina mulher, se gritou uma mulher que a outras mulheres também ama.
Se gritou uma mulher de dor, que da dor se descobriu a cor (preta). Se gritou mulher de força (preta). Se gritou mulher de luta (preta).
Do caderno de dois reais, a menina mulher preta, que amava outras mulheres, mostrou ao mundo sua pequenez gigante. Das letras ela cantou o verso, o método, a hipótese e a temida conclusão.
Das letras do caderno de dois reais, a menina mulher preta, que amava outras mulheres, que pensava ter chegado à conclusão, finalizou tudo com uma introdução: Escrevo à minha procura. Nas letras fui, sou e ainda ei de ser.