Medo de amar

Às vezes, tenho medo de amar. Esse medo não impede um querer. Tenho medo do que é amar. Amar dar-se. Como se o tempo se alterasse. Não ficar quieto diante do que se ama. Dá medo de amar. Ainda que amar possa ser alegre também pode ser mágoa. No fundo, o medo é ficar arrasada. Perder as forças. Soltar os braços. Sustentar promessas. O amor não é pré-datado. Amar é agora. Medo é amanhã. Agora assusta. O amanhã penso que posso controlar. Como se fosse capaz de mudar o amanhã ainda que não tenha feito nada disso hoje para algo se alterar. Presunçoso. O agora é perigoso. Alta voltagem. O medo de tocar. Perigo de morte atravessado pelo perigo de vida. Amar o instante também assusta. Amar por esforço é treino. Não é entrega. É prática. Técnica. Repetição que abranda a angústia. Não dá medo. O medo é um suposto saber. Tenho medo de achar que vou saber o que quero daqui a uma década, um mês. Se achar que sei estou aceitando o previsível. Impossível saber sobre o inefável. O óbvio ululante é um pleonasmo. É óbvio que amar dá medo. Ele nos faz pensar que a vida pode acabar sem acontecer. E o medo não vai salvar. Nunca escutei histórias do medo que salva. Ele protege. O medo da morte. O medo da vida pode ser amar. Amar revoluciona. Clichê antigo. A história mais antiga do mundo. Um dos mistérios do nosso universo particular. Amar-se, amar alguém e ser amado também. Uma forma de querer a vida. Amar sem temer é imprudência, mas temer o amor é insensatez. A vida não pode caducar.

Severo Garcia
Enviado por Severo Garcia em 10/01/2022
Código do texto: T7425971
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