MALDITAS VOZES DO INFERNO
"Estou no começo do meu desespero, e só vejo dois
caminhos: ou viro doida, ou santa"
(Adélia Prado)
" - Quem me dera s’eu não estivesse mais aqui...!
Ah! Pro diabo com o juízo e com a razão!
Afastem-se de mim, pelo amor de Deus (se é qu'Ele existe)
E que a voz da lucidez vá para o quinto dos infernos!
- Oh! Bem sabeis, ó Morte, o quanto não vos amo
Mas, que nest'hora para mim olho (ainda que não me veja)
D'um sei lá o quê a roubar minha pouca razão (que ainda tinha)
Pelo que tão confuso eis que agora m'encontro
Que, pois farei então?
Verdade qu'eu não sei..."
E co'essas palavras a atormenta'alma dirigia à Vida
"Eloí, Eloí, lamá sabactâni"
"Deus meu, Deus meu, por que me desamparaste"
Místicas palavras do salmista
A que o próprio Cristo pronunciou... (na cruz)
Oh! Quem aqui nunca as disse, pelo menos uma vez na vida?
Desesperação!
N'ação e efeito de quem não mais suporta a luta?
Ah! E acaso o que alguém ganhará "entregando os pontos"?
Muito embora sabemos que o viver não é fácil...
Contudo, como as estações que não deixam de vir
... também essas horas chegam:
As escuras horas do desespero!
Oh! Estaria a alma com raiva da vida?
Estaria, quem sabe, co'ela zangada?
Não ter... esperança!
Com certeza não existe nada pior a s'experimentar... no tempo
Ah! Sombrias noites d'agonia
Da miserável vida a querer fecundar-se por debaixo da terra
Todavia, no solo d'um cemitério qualquer
Porém, eis que ouço da Vida a duramente repreender-me:
"Não faças a bobagem que nest'instante te pretendes,
(dando ouvidos às estranhas vozes do escuro de tu'alma)
E, se contigo mesmo não te importas, importa-te então...
[com quem importas contigo
Oh! Quem dera se iluminada sempr’estivesse a alma!
Porém, quanto a Verdade d'alguém foges (e não se percebe)
Nas escuras horas em que o coração s’entritece
Ou das malditas vozes de nossos fantasmas
(Qu’em tal grau nos atormentam e agitam)
Que fazer, então?
Talvez, não fazer nada... seja o melhor
Somos feitos d’essência divina
Todavia, por vezes, esquecemos...
E, n’aminésia de tal hora [tão negra] eis que nos deixamos enganar
... por elas – as perversas sugestões de tais vozes
Quanto te perdes em acatá-las!
Quanto de perderás (por inteiro) em lhe obedecê-las!
Não dialogues co’elas
Não dê atenção a elas... (para o teu próprio bem)
Adormecerá, sim, a vida
Contudo, no tempo de su’hora (certa)
D’ocaso a que se fará o dia em seu termo
Deste que não avança no tempo
E, portanto, espera o seu natural momento
Sejamos, pois, como o dia
A se passar no compasso de suas horas... calmo e sereno
Para quê adiantar o que virá em seu tempo?
A morte, com certeza, virá e a ninguém s’esquivará
Todavia, para cad’um... em seu devido... tempo
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04 de setembro de 2021