Quem somos nós?

O problema é que tratamos as pessoas como se fossem objetos, simples mercadorias, produtos disponíveis para o consumo que, tão logo cumpram o que deles esperávamos, descartamos como se nunca tivessem tido alguma utilidade. Tratamos as pessoas dessa maneira em dois momentos: primeiro quando as julgamos e segundo quando as desprezamos.

No caso do julgamento é muito simples de entender. Quando vamos ao supermercado ou adentramos uma livraria procuramos pelo rótulo do produto, pela sinopse do livro. As informações ali contidas são úteis até certo ponto, porque é na prática que veremos como eles realmente funcionam. É na escovação que descobriremos se aquela escova de dente é mesmo tão diferente das outras, é na leitura que enfim saberemos se aquela história que nos chamou a atenção merece mesmo a posição de best-seller. Fazemos isso com as pessoas. Primeiro apenas descrevendo-as externamente e encaixando-as em caixinhas que fabricamos previamente: se tem olhos azuis então eu aceito, se gosta de rosa então eu reprovo. Quando não é assim, deixamo-nos levar pelas descrições prontas. “Ah, é porque me disseram que fulano se comporta assim e pensa assado”. Mas nós não nos aproximamos realmente das pessoas para saber quem elas são. Quem elas realmente são. O que possuem de fato dentro de si.

E é tão simples perguntar. É tão simples permitir que as pessoas se expliquem e façam entender. Mas nós, em nossa petulância de querer saber tudo sobre todas as coisas, inclusive sobre todos os seres humanos que habitam o mundo, achamo-nos no direito de definir quem as pessoas são apenas por uma palavra que elas disseram, por um jeito de falar que expressaram ou por uma vestimenta que demonstraram preferir. Em nossos julgamentos somos completamente ignorantes porque ninguém sabe nada sobre ninguém. Tudo o que sabemos é o que está por fora. No entanto, para sobreviver em um mundo de cobranças e exigências, a maioria de nós está vestida por algum personagem, não são exatamente o que são, e mesmo que jurem dizendo que são cem por cento autênticas, alguma coisa elas escondem. Então apenas nós sabemos quem realmente somos. Precisamos perguntar quem as pessoas são.

E nessa de perguntar quem as pessoas são podemos dar a elas a chance de se ouvirem e de se enxergarem. Sim. Às vezes nos comportarmos sem entender o nosso comportamento, às vezes agimos de maneira completamente oposta àquela que dizemos preferir. Somos falsos? Hipócritas? Talvez só sejamos seres humanos suscetíveis aos erros, às discordâncias, com possibilidade de amadurecimento e crescimento. É óbvio que não estou me referindo a pessoas preconceituosas, intolerantes, que disfarçam o seu ódio em discursos dissimulados sendo que já tiveram a chance de aprender, mas recusaram. Estes têm problemas de caráter. Estou me referindo a todos nós que podemos errar em algum momento seja qual for a razão, mas que temos condições – e abertura – de retroceder em nossos passos, pedir perdão e aprender. Por isso não julgue as pessoas pelas suas aparências. Nem acredite nas descrições que fizeram delas. Permita que elas mesmas se descrevam a você, ainda que não de forma verbal, mas aproxime-se, conviva um pouco, você pode descobrir muitas coisas agindo como um observador interessado.

Por fim, referi-me lá em cima que tratamos as pessoas como mercadorias porque também as descartamos com uma facilidade assustadora. “Consegui o que queria, não há mais nada que possa me interessar”. Onde foi parar a nossa humanidade? Além de simplesmente condenarmos as pessoas por suposições enviesadas, também as jogamos fora como se fossem embalagem de salgadinho. As pessoas são muito mais do que isso. O valor que elas possuem dinheiro algum pagaria. E nós podemos tê-las em nossas vidas, enriquecendo-nos de diversas maneiras, gratuitamente. Desde que saibamos valorizá-las.

Não viva com mesquinharia. Não passe por esse mundo sendo um egoísta individualista. Não queira que as pessoas assumam quem você quer que elas sejam. Nem trate aqueles que sentem algum apreço por você como se fossem um recurso acessado em último caso. Um dia você poderá estar na posição de julgado, sendo tratado como dispensável. E tudo o que mais desejará será sentir uma gota de humanidade lhe dirigida. Não chegue a esse ponto. Porque quando nos revestimos de humildade e sabedoria no trato com o próximo, sempre teremos alguém que também nos veja como seu próximo!

(Texto de @Amilton.Jnior)