A primeira crise
Esses dias os pesadelos estão cada vez mais intensos e vívidos. Homens me estuprando no banheiro da Universidade, crianças arrancando os próprios olhos, paralisias do sono...
Senti-me estranha hoje de manhã. Muito estranha. Chorei muito, pressentindo que amanhã terei que voltar pra minha casa e não terei mais o Thales pra segurar minhas mãos cobertas com meias durante a noite, para eu não me arranhar durante o sono e acordar toda ferida. Acordei-o com beijos e um abraço. Ficamos deitados um tempo e depois de eu fazer algumas atividades pendentes tomando café, fomos preparar o almoço. Eu cantei várias músicas, porque parecia que tudo ficava vazio demais para suportar se eu não mantivesse minha mente ocupada. Até comentei que o dia estava com cara de final de domingo, aquela melancolia, aquela tristeza e o vazio...
De tarde, assistimos Irmão do Jorel (ao lado dele, me dou o luxo de ser fútil e ver um desenho inútil que só me dá prazer... como adoro as coisas inúteis). Mas de repente, minha irmã ligou. Meu pai chegou bêbado em casa. Brigou com minha irmã, bateu nela, tentou matar minha mãe e deixou hematomas em seu braço. É sempre ele.
Consolei-as e tentei me acalmar. Mas de repente, quando minha irmã não respondeu mais as mensagens, meus ouvidos pararam de funcionar. Minha mão esquerda começou a formigar e se contorcer involuntariamente, como se quisesse me castigar. Senti uma dor imensa, não quis me desesperar, tentei levantar e lavar o rosto, mas notei que minhas pernas também se contorciam e semti uma dor horrível. Sentei na cama, meus braços e minhas pernas não me obedeciam, se contorciam como se uma mão invisível puxasse.
Thales me socorreu, mas ficou mais desesperado que eu, pensou que eu estava morrendo. E eu realmente tive medo de ser isso. Tentava puxar o ar, mas ele não vinha. Comecei a gritar de tanta dor enquanto meu corpo se contorcia e Thales me segurava forte. Chamaram um uber e me levaram para o hospital. Não lembro de nada do que aconteceu nesse intervalo entre levantar da cama e entrar no carro. Thales me disse que eu não conseguia andar, mas ele me puxou e eu entrei no carro, só lembro do frio que senti apesar de estar muito suada no carro. Fiquei me perguntando como tinha entrado lá, mas a dor foi tanta que só conseguia pensar que ia morrer.
Me colocaram numa cadeira de rodas, me levaram até uma sala e a técnica em enfermagem Lígia (acho que era esse o nome) foi muito compreensiva comigo. Ela pediu que eu respirasse com calma. Consegui deitar na maca, mas não sentia meus braços ainda. Só os vi de relance tortos. Fechei meus olhos enquanto aplicavam algo na minha veia. Eu apaguei. Acordei duas horas depois, um pouco tonta e não conseguia falar direito. Parece que minha boca estava anestesiada. Vi Thales sentado ao meu lado, preocupado. Aos poucos, consegui recuperar os movimentos dos braços e das pernas. Entrei lá antes das 18 horas. Saí depois das 20. A médica me aconselhou procurar uma unidade CAPS e tentar fazer psicoterapia, já que é a segunda vez que tenho uma crise assim. Na primeira vez, não tive espasmos musculares.
Me sinto culpada. Não quero voltar pra casa, mas também não quero ficar aqui. Quero ir para lugar nenhum, quero sumir, não aguento mais me sentir fraca e despertar os olhares penosos das pessoas.
09/09/2021