Ouvidos, mas não ouvintes

Já notou que o mundo vive em polvorosa? É uma gritaria indistinguível, um tumulto confuso, uma balbúrdia sem limites. Todos querem falar. Ao mesmo tempo. E todos querem que suas falas sejam ouvidas de ponta a ponta. E muito pouco daqueles que falam se prestam a ouvir o que está sendo dito. É isso. As pessoas querem ser ouvidas, mas não querem ser ouvintes. Querem contar sobre as suas dores e lágrimas, mas não têm paciência para acolher o sofrimento e a angústia do outro. Querem contar suas conquistas e sonhos, mas menosprezam a vitória do próximo e ridicularizam os seus projetos. As pessoas querem ser notadas, aplaudidas, admiradas, mas em sua mesquinharia petulante não querem aplaudir, notar, muito menos admirar. São egoístas demais, orgulhosas ao extremo, para dividirem o palco da vida com outros personagens.

E a tragédia está feita.

Nesta de todos quererem falar sobre tudo como se realmente soubessem do que estão falando, muitos já foram enganados, ignorados, desprezados. Quantos que não se sufocaram pelas próprias palavras? Que por não conseguirem ser ouvidos desistiram de tentar? Quantos que, sendo donos de palavras suaves, calaram-se diante de um mundo de gritarias pérfidas? Quantos que, afogando em suas próprias lágrimas, partiram sem que ninguém percebesse? O nosso egoísmo, o nosso egocentrismo, a nossa mesquinharia, tudo isso nos torna pessoas vazias, sem significado, pessoas que apenas proferem um amontoado de palavras sem sentido, sem importância, sem o poder de transformação, sem o poder de tocar os corações. Cora Coralina aconselhou que “nada do que vivemos tem sentido se não tocarmos os corações das pessoas”. Quem é que conseguimos tocar apenas falando trivialidades como se fossem o elixir da vida?

Só podemos nos tornar pessoas melhores se nos calarmos um pouco. Precisamos parar com essa necessidade descontrolada e desmedida de fazer com que nossos discursos sejam compartilhados ao mundo todo. Precisamos parar com essa arrogância de achar que somos donos da razão e que aqueles que de nós discordam não passam de ignorantes sem valor. Os verdadeiros ignorantes são aqueles que acham que para a vida valer a pena eles devem ser notados, ouvidos e aplaudidos. São ignorantes porque vivem para provocar reações, para provocar comentários, para causar repercussões. E nesse tolo desperdício de vida ignoram que para a vida realmente valer a pena basta que consigamos uma só proeza: tocar o coração de alguém. Seus discursos tocam algum coração? Confortam alguma alma? Consolam alguma lágrima? Ou é feito por fazer? Apenas para que sua voz ecoe pelo vento? Por não ouvir talvez você esteja sendo o maior dos ignorantes.

Mas ouvir não se resume a apenas se atentar ao que as outras pessoas estão falando. Ouvir também implica dizer que prestamos atenção em gestos, em atitudes, nas mais sutis demonstrações. Alguns não dizem com palavras, não conseguem articular discursos, mas seus corações se manifestam através de comportamentos sutis, delicados, mas ricos de significado. Você consegue entender as pessoas através de seus gestos? Consegue ouvi-las apenas olhando em seus olhos? Ou está ocupado demais com seu próprio ego para prestar atenção naqueles que o rodeiam? Alguém bem do seu lado talvez só esteja precisando de um abraço, mas você está tão cego pela sua superestimada existência que não consegue perceber que suas palavras podem ser inúteis e vazias para alguém que só almeja uma companhia sincera. Fale, mas não muito. E jamais se canse de ouvir.

(Texto de @Amilton.Jnior)