Legítima defesa

Bem que me esforcei para ser gentil,
bem-educado,
quando tirava da cartola o sorriso esperado,
como quem tira do coração um coelho qualquer
e esquece do peito a faca enterrada.
 
Já não tiro da cartola os heróis da plateia.
 
Decretarão a falência da minha educação,
mas ninguém decretará
a falência da minha cabeça
e das minhas mãos quando escrevo.
 
Posso até perder os amigos e a poesia,
mas não posso perder a liberdade.
 
Não carrego bandeiras que não são minhas,
principalmente bandeiras por acaso vermelhas,
e das turbas recuso as palavras de ordem.
 
Nunca  entendi a camiseta do « che ».
Não entendo o que é ser duro
e matar com ternura,
sem perder a formosura
da vermelha ditadura.
Há quem dê vivas à democracia
para instalar a ditadura...
(Há, confiram).
 
Os jornais do dia seguro com a ponta dos dedos,
seus editoriais olho de soslaio,
suas crônicas,
muitas,
são primaveris e vis,
e rescendem mais a esterco que flores,
quando cantam a primavera.
(As exceções são poucas).
 
Quanto aos amigos,
muitos não me reconhecerão.
 
Eu, mágico, já sem luvas e sem cartola.
Eu, sem bandeirolas e sem gritos de guerra.
Totalmente sem graça.
Eu, agora.
 
Sem gritos de guerra,
mas com palavras,

em legítima defesa.
 
Itamar BC
Enviado por Itamar BC em 14/05/2021
Código do texto: T7255827
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