Quarentona
Quando pequena, imaginava o que seria uma quarentona. Estranhava - e continuo estranhando- rótulos, porque não vejo pessoas como produtos, sendo, portanto, desnecessária qualquer classificação. Ao mesmo tempo, olhava as "quarentonas" como mulheres iguais, produzidas em série. Pra mim, inocente nos meus poucos anos, quarentona era uma tia que tinha uma aliança e podia pagar as compras no caixa. Eram as amigas das minhas mães, as professoras, as pessoas que trabalhavam no Colégio e se vestiam de forma mais sóbria. Eram aquelas que levavam as crianças pelas mãos, que tinham horário pra chegar em casa. E o sufixo "ona" dava-lhes um peso de eternidade, como se aquela condição fosse imutável. Eu pensava que aquilo estava muito longe de mim, uma posição de importância e até poder, uma sensação de ser suficiente pra si mesma. Então, eu ansiava pelo dia em que pudesse ocupar o banco da frente do carro, mas nunca como motorista: mesmo uma quarentona teria limites. Haveria alguém que de certo modo seria o responsável pelo título - o marido, o namorado ou até um ficante. Não era a idade que a definia e sim um composto de tempo, sexo e relacionamento. Hoje, muita coisa mudou; eu sou a quarentona, mas não aquela, daqueles tempos. Não tenho aliança, nem filhos. Respiro uma liberdade que elas talvez não tivessem e que eu mesma conquistei. Quando quero me distrair, posso fazer um texto em vez de assar um bolo, o que pode ser muito mais gostoso e promissor. Não levo ninguém pela mão a não ser eu mesma. Hoje, quando as crianças me chamam de tia, por baixo da máscara me escapa um sorriso: agora eu sou a quarentona. E isso é bom.