Viver a mesma vida eternamente
Uma de minhas leituras durante esse ano de 2020 foi o maravilhoso livro “De Frente para o Sol”, que nos leva a um despertar surpreendente sobre a morte, essa experiência tão indesejável, dificilmente discutida, bravamente ignorada, mas que todos, em algum momento de nossa frágil existência, precisaremos enfrentar. Falarei com mais detalhes sobre esse livro na próxima edição da Revista Coisas da Vida que deverá ser lançada no ano que vem, por hora quero transmitir uma reflexão que fiz numa das tantas e graciosas passagens dessa obra que fala, sobretudo, sobre a nossa condição de finitude.
O tema morte inquietou muitos pensadores ao longo da história, vários filósofos refletiram sobre o assunto apresentando suas visões sobre o temor de toda gente, bem como elencando possíveis caminhos para que o tormento, o pavor, a angústia da morte pudessem ser, de certa maneira, suavizados, enfrentados com maior sucesso. Há quem diga que para morrer bem é necessário viver bem. E isso faz todo o sentido. Uma vida bem vivida, no seu final, dificilmente nos garantirá a dor de arrependimentos pelo que deixamos de viver, ainda que esse lamento nos alcance ele será mínimo perto de todos os motivos que teremos para agradecer e nos orgulharmos da história que escrevemos.
Dentre esses pensamentos quero destacar o de Nietzsche, filósofo famoso, importante, genial e polêmico. Ele pensou sobre a morte, aliás, esse é o pensamento de qualquer homem e qualquer mulher que esteja respirando, ainda que não perceba, ainda que inconscientemente, mas todos tememos e pensamos sobre o fim. O pensamento do filósofo foi citado no livro anteriormente mencionado, nas minhas resumidas e distintas palavras, ele provocou a seguinte indagação: se você tivesse que reviver infinitamente a vida que você levou, com todas as mesmas experiências, com todas as mesmas dores, com todos os mesmos sorrisos, com todas as mesmas decisões e consequências de tais escolhas, isso lhe seria tido por maldição ou bênção? Reflita um pouco. Se quiser pare a leitura por alguns instantes e veja se gostaria de reviver tudo o que até aqui viveu, como num filme que assistimos pela décima vez, seria prazeroso ou torturante? Se você se alegrou pelo caminho até aqui trilhado, quero parabenizá-lo, por certo tem vivido da maneira certa. Mesmo com as dores que precisou suportar, com as decepções que teve que encarar, com as alegrias que invadiram o seu coração e com as conquistas que fizeram cada esforço valer a pena, tudo isso serviu de aprendizado, de crescimento, ou então você encarou todas essas experiências dessa forma, então merece ser parabenizado e encorajado a permanecer por esse ângulo da existência.
Mas com certeza alguém disse que detestaria passar por tudo outra vez. E se você for essa pessoa que veria a repetição da sua história como uma maldição eu quero ter a liberdade de lhe fazer uma profunda pergunta: não é essa a vida que você está levando? E se seria tão desagradável assim por que insistir nela? Por que correr o risco de terminar os seus dias arrependido por tudo o que deixou de fazer embora fosse o seu desejo? Não estou dizendo para que desista da sua história, esse não é o caminho mais satisfatório, não podemos simplesmente fechar o nosso livro, colocá-lo debaixo do braço e mais tarde lançá-lo ao fogo. Mas você pode colocar um ponto no atual parágrafo. Você pode virar a página e começar um novo capítulo. Você tem o direito de alterar o enredo, mudar o cenário, trocar as personagens se assim for necessário, corrigir o roteiro e assumir a sua verdadeira história, criar reviravoltas impressionantes, desfechos valiosos e incomparáveis, você pode mudar a realidade e fazer da sua vida um daqueles filmes que nunca cansamos de assistir.
Eu desejo que a sua resposta mude daqui a alguns anos. Eu espero que você possa ser confrontado com essa mesma reflexão e nem pense muito ao responder que reviver a sua história seria gratificante, seria uma valiosa chance de reviver as mesmas emoções, os mesmos sentimentos, os mesmos caminhos, os mesmos diálogos, os mesmos abraços, os mesmos carinhos, as mesmas reconciliações, os mesmos aprendizados. Sua vida não precisa ser perfeita. Erros sempre nos acometerão. Mas sua vida pode ser a mais plena e satisfatória possível. Você merece sorrir depois do choro, cantar depois do silêncio, abraçar depois da perda. Você merece viver!
(Texto de @Amilton.Jnior)