Reminiscências de um Outono.- 1970 -
Reminiscências de um Outono.- 1970 -
Sentada na calçada de minha casa
Via o movimento da rua
O céu estava tão lindo,
As nuvens brancas passeavam e se
cumprimentavam no ar
Eu ficava olhando as formas que elas faziam...
SHora tinham cara de palhaço, hora de cachorro.
Às vezes de roseiras, anjos, bolas, borboletas.
Até a carinha de minha boneca elas imitavam.
Ah, que bela manhã de outono!
Eu achava muita graça das nuvens
Gostava tanto de admirá-las...
Conhecia cada uma: Maria, Moli, Margarida e Manhã.
Eram tantos nomes, mas o batismo era meu, eu os criava.
Num dia de março assisti a Moli ficando negra,
Com cara brava...Com olhar de má.
E, de repente, começou a chorar e molhou a terra.
Ah. Moli, não chore, disse eu.
Tenho medo quando isso acontece.
Foi a Maria que brigou com você?
Por que tanto barulho, Moli?
Não vou ficar te olhando,
As faíscas estão aumentando.
São raios, diz meu pai!
Ah tenho medo disso.
Mas ela chorou muito, muito...
Seu pranto inundou a terra e não sobrou ninguém nas ruas.
Sei que foi um grande estrago,
Mas eram as águas de março fechando o verão...
Tudo passou e Moli se foi.
Suas irmãs a seguiram.
Trocaram de cor, ficaram brancas de nôvo, as vezes cinza.
Que bom, a briga passou.
As folhas caiam das árvores e eram
empurradas pelo vento.
Visitavam as casas, passavam pelos portões.
As aves voavam em bando para algum lugar,
E o céu permanecia quieto, com suas nuvens brincalhonas.
Ah que saudade daquele outono!
Era época da colheita
Vi as hortas da região sendo esvaziadas.
Eu nada entendia...
Uma interrogação me acompanhava,
Mas o meu coração, ah...
O meu coração era feliz e puro...
Era belo, carinhoso e queria ver tudo do mesmo jeito,
Naquela rotina que me fazia tão bem.
Ia fazer compras na padaria ou na quitanda
Seguindo a pé pelo meio fio...
Conseguia sempre me equilibrar, não caía.
E quando chegava em casa, feliz eu sorria.
Só sei que já estávamos em Abril, no outono de 1970.
Eu corria para o portão e sentava na calçada
Para apreciar as modas,
ver o tempo, as gentes.
Vem pra dentro, gritava mamãe!
Tá na hora de estudar!
Depois você aprecia as modas,
É melhor você entrar.
Eu não via moda alguma
todos eram mal vestidos
As roupas eram surradas
Mas a alma do lugar, essa sim, tinha cheiro de mato,
de terra molhada.
Naquele lugar, naquele bairro pobre,
existia luz, existia amizade...
Quando a terra subia, embalada pelo vento,
ou pelo chute dos moleques nas peladas da esquina,
eu não via moda... via vida.
Outono de 1970.
Niterói/RJ, 12 de Agôsto de 2005
Amália Klopper
Reminiscências de um Outono.- 1970 -
Sentada na calçada de minha casa
Via o movimento da rua
O céu estava tão lindo,
As nuvens brancas passeavam e se
cumprimentavam no ar
Eu ficava olhando as formas que elas faziam...
SHora tinham cara de palhaço, hora de cachorro.
Às vezes de roseiras, anjos, bolas, borboletas.
Até a carinha de minha boneca elas imitavam.
Ah, que bela manhã de outono!
Eu achava muita graça das nuvens
Gostava tanto de admirá-las...
Conhecia cada uma: Maria, Moli, Margarida e Manhã.
Eram tantos nomes, mas o batismo era meu, eu os criava.
Num dia de março assisti a Moli ficando negra,
Com cara brava...Com olhar de má.
E, de repente, começou a chorar e molhou a terra.
Ah. Moli, não chore, disse eu.
Tenho medo quando isso acontece.
Foi a Maria que brigou com você?
Por que tanto barulho, Moli?
Não vou ficar te olhando,
As faíscas estão aumentando.
São raios, diz meu pai!
Ah tenho medo disso.
Mas ela chorou muito, muito...
Seu pranto inundou a terra e não sobrou ninguém nas ruas.
Sei que foi um grande estrago,
Mas eram as águas de março fechando o verão...
Tudo passou e Moli se foi.
Suas irmãs a seguiram.
Trocaram de cor, ficaram brancas de nôvo, as vezes cinza.
Que bom, a briga passou.
As folhas caiam das árvores e eram
empurradas pelo vento.
Visitavam as casas, passavam pelos portões.
As aves voavam em bando para algum lugar,
E o céu permanecia quieto, com suas nuvens brincalhonas.
Ah que saudade daquele outono!
Era época da colheita
Vi as hortas da região sendo esvaziadas.
Eu nada entendia...
Uma interrogação me acompanhava,
Mas o meu coração, ah...
O meu coração era feliz e puro...
Era belo, carinhoso e queria ver tudo do mesmo jeito,
Naquela rotina que me fazia tão bem.
Ia fazer compras na padaria ou na quitanda
Seguindo a pé pelo meio fio...
Conseguia sempre me equilibrar, não caía.
E quando chegava em casa, feliz eu sorria.
Só sei que já estávamos em Abril, no outono de 1970.
Eu corria para o portão e sentava na calçada
Para apreciar as modas,
ver o tempo, as gentes.
Vem pra dentro, gritava mamãe!
Tá na hora de estudar!
Depois você aprecia as modas,
É melhor você entrar.
Eu não via moda alguma
todos eram mal vestidos
As roupas eram surradas
Mas a alma do lugar, essa sim, tinha cheiro de mato,
de terra molhada.
Naquele lugar, naquele bairro pobre,
existia luz, existia amizade...
Quando a terra subia, embalada pelo vento,
ou pelo chute dos moleques nas peladas da esquina,
eu não via moda... via vida.
Outono de 1970.
Niterói/RJ, 12 de Agôsto de 2005
Amália Klopper