Reflexões de quarentena
Os últimos dias tem sido difíceis; há duas semanas que venho colocando a culpa da minha angústia na TPM, a questão é que já estou na terceira semana, o mar vermelho já veio, e nada deste tormento passar.
Resolvi escrever já que nem mesmo minhas orações foram suficientes para aliviar esse vazio que é mais uma falta de mim mesma. Uma baixa autoestima que leva a insegurança, ansiedade, carência, codependência e uma inquietude infinita.
Quer dizer, as intuições vêm, mas sou eu quem ainda não está convencida dos conselhos dados pela espiritualidade. Ainda insisto na auto sabotagem, em pensamentos tóxicos que refletem uma relação abusiva com meu próprio eu.
Fantasminhas da cobrança que se fazem presentes em todos os momentos seja no trabalho em que meu esforço nunca parece suficiente levando a uma necessidade constante de me inscrever em novos cursos a cada semana a fim de me sentir produtiva. Apesar da ansiedade, é algo que me mantém distante de certos julgamentos que aparecem em momentos de lazer, além de ter a impressão de que estou perdendo tempo com algo “fútil”.
Há algum tempo me acostumei com a rotina corrida do estudo o que se tornou meu novo “normal” e não está sendo fácil ressignificá-lo. Aliás, este tem sido o maior desafio; ressignificar o passado, especialmente aqueles momentos que ainda trazem sofrimento.
Reforma íntima é um processo que exige uma carga emocional intensa, porém no dia-a-dia é algo que se dissipa e cada etapa é realizada aos poucos, no entanto, devido à pandemia e consequentemente nossa nova realidade, essa reforma está se sobrepondo, ou melhor, está acontecendo de forma atropelada e receio não estar dando conta de tantos pensamentos turbulentos ao mesmo tempo. À principio é natural que isso ocorra para depois se ter “insights” sobre eles, porém as dúvidas têm surgido numa velocidade maior do que as soluções.
A cada dia tenho certeza que o momento de felicidade plena no ano passado, após ter me assumido, foi bastante ilusório, pois não fazia ideia do quanto ainda havia para ser mexido aqui dentro. Sou grata pela oportunidade de transformação, mas não imaginei o quão desgastante seria a ponto de desejar apenas entrar num estado de hibernação até que comprovem a eficácia da vacina e aí sim pudesse acordar. Se bem que nem meus sonhos têm sido agradáveis durante à noite o que não poderia esperar menos de um inconsciente sobrecarregado.
O fato é que muitas destas indagações já não deveriam fazer parte deste novo eu já há muito tempo; elas não pertencem mais a pessoa na qual me tornei. Se é cansativo pensar a respeito dos novos problemas, quem dirá trazer a tona os velhos todas às vezes. Eu não posso apagá-los, pois se faz necessário revisitar o passado para me lembrar de não cometer o mesmo erro novamente. Preciso então encontrar um meio de viver sem medo de mexer nas feridas de qualquer tempo já que elas são a verdadeira razão da força que está aí perdida em algum lugar.
Adequar-se a esse mundo de regeneração não é para qualquer um, principalmente para aqueles que esperam pela mudança em todos os seus sentidos. Confesso que no inicio até estava empolgada com tantas descobertas e intuições sobre o que vinha aprendendo ao meu respeito, no entanto tantas desconstruções me fizeram perder o controle. Bom, mas talvez se trate exatamente disto, não é? Afinal, se a vida não veio com um manual, por que nosso anseio de controlar tudo? Como diria uma amiga distante, imagine o quão chato seria se conseguíssemos premeditar cada passo se boa parte dos momentos da vida acontecem também nos imprevistos.
Tenho procurado me aproximar da minha vulnerabilidade, embora ainda não sejamos grandes amigas, pois quando se tem a síndrome de Superman, a vulnerabilidade se torna Lex Luthor. Metáfora infeliz, mas tudo bem, já tive dias melhores. Pois uma vez que você se posiciona como super-herói, o “salvador da pátria”, demonstrar fragilidade é uma ofensa para o ego. Quando isso na verdade é o que nos faz lembrar-se de nossa essência humana.
Aprendi da maneira mais dolorosa que não posso salvar a todos, principalmente quando há quem não quer ser salvo e quando somente o faço por reconhecimento.
Além de tudo, tem ainda a vida adulta que está aí batendo na porta e está mais do que na hora de mudar a sala de controle dos Divertidamentes. Aquelas idealizações da infância que talvez devessem estar próximos, mas parecem cada vez mais distantes. Buscamos autonomia ao mesmo tempo em que temos medo de arcar com as consequências de nossas ações, dentre tantas outras expectativas com relação ao futuro que geram uma ansiedade constante. O fato é que a fase adulta já chegou, só não tínhamos nos dado conta disso.
Estamos aqui para evoluir e com a ciência de que estamos dando o nosso melhor. Somos perfeitos em nossas imperfeições e é aí que encontramos o equilíbrio já que tanto a luz ou escuridão em excesso nos deixam cegos.
Giulianna Loffredo (15/07/2020)