diálogo com paisagens – Ato I
desdobramento
certa vez aconteci assim:
o dia escorreu dos meus olhos.
fui sol e lua, asa e vento.
da janela do quarto
uma afabilidade de ipês multicores
lançavam-me anzóis amistosos.
borboletas sepultavam colóquios.
assim eram meus passos:
a mente se descolou das horas,
esse marcador abstrato que não mensura e não existe.
meu tempo era ser.
meus passos sentir-me.
meu caminho a descoberta.
houve taxia entrando em meus poros
em algum momento vindo do trabalho.
colei-me às propriedades do dia.
de certo jeito eu dialogava com paisagens.
de certa forma eu era alguma coisa entre as casas e suas pessoas.
estava em mim:
esse percurso da semente ingerida à entranhas de aves.
esse saber que não é em vão o que apodrece no solo.
que não há nuvens desnecessárias.
esse ir dos rios é o que mais amei o dia inteiro.
o maior espanto foi sobre a morte:
serei como a fruta que despenca.
nada estará perdido.
serei de qualquer forma, o que o amanhã trará!