Habermas e a Educação
Nos últimos anos o trabalho de J. Habermas produziu impactos na reflexão e na prática pedagógica, contribuindo para o desenvolvimento de propostas frutíferas com implicações em diversos aspectos da educação, entre eles o político, o organizacional, o didático, etc. A mais negativa influencia da racionalidade sistêmica sobre a educação pode ser verificada nas conseqüências de sua transformação em mercadoria, e, se tornando mercadoria ou meio de competitividade dentro do processo capitalista sua valorização passa a ser feita, principalmente por critérios de lucratividade e eficiência, perdendo a sua conotação e significação de valor social. Segundo Kuiavaetal.(2008,p.35), “Os elementos conceituais do agir comunicativo podem ser examinados detalhadamente e acrescidos de novas dimensões capazes de tipificar melhor o caráter formativo da ação pedagógica.”
Com base na teoria de Habermas, o conhecimento não se apresenta mais como algo pronto e acabado, mas revela-se apoiado nas relações intersubjetivas que, por sua vez, estão fundamentadas no discurso argumentativo, na comunicação, linguagem e consenso.
Neste sentido, a educação passa a ter seu valor atrelado aos anseios de crescimento econômico e social, ficando para segundo plano a sua validade enquanto recurso de qualificação subjetiva e de formação de uma visão social e política. Somos cientes de que a teoria de Habermas não foi especificamente elaborada para compreender a educação, porém, apresenta valiosas contribuições nesse campo. A educação é um grande desafio do pensamento habermasiano para hoje, o compreender do processo educativo como a formação simultânea do indivíduo como um indivíduo insubstituível, com sua identidade pessoal e projeto da vida, também possuidor de uma identidade cultural, como um cidadão e participante político de um determinado grupo social. Ressalta-se que Habermas inicialmente compreendeu a educação no viés iluminista, sobretudo Kantiano, contudo, reformulou seus conceitos de educação ao ter contato com as concepções de Adorno, em que para ele, o educar é desbarbarizar e fazer o ser humano compreender que ele é um sujeito histórico social e livre de medos. Sem medo e sem pavor da própria vida. Desta forma, para Habermas o educar é emancipar, e emancipar é fazer com que o ator social possa agir livre de amarras, condicionamento ou patrulhamento, seja político, religioso ou cultura. O sujeito educado é um sujeito esclarecido, mas além de esclarecido ele é um sujeito livre e autônomo. Visto que a relação entre professor e aluno, sendo baseada numa razão comunicativa, a qual valoriza a interação entre sujeitos mediada pela linguagem e pela capacidade argumentativa, e conseqüentemente favorece o entendimento mútuo, o afloramento de novos conhecimentos e a emancipação humana.
A contemporaneidade traz a exigência da formação de indivíduos cada vez mais aptos a interagirem com este contexto, e neste ambiente é que se situam a escola, as universidades e, mais precisamente, a figura docente, pois é através da ação do professor que a educação é mediada. Sem dúvidas a interlocução dos saberes do professor se dá pela constante ação e interação comunicativa docente, pela ação dos seus saberes e interação com os outros saberes, no caso, dos seus pares, dos seus alunos e, com isso, torna-se possível ressignificar o saber anterior de ambas as partes, pelo consenso através de uma racionalidade comunicativo-reflexiva.
A educação atual necessita basear-se na ação comunicativa, de tal modo que nos permita participar mais ativamente e de forma mais critica e reflexiva na sociedade.
“Os elementos conceituais do agir comunicativo podem ser examinados detalhadamente e acrescidos de novas dimensões capazes de tipificar melhor o caráter formativo da ação pedagógica”. (PAVIANI ,2008,p.35)
Se, pretendo e pretendemos superar a desigualdade que gera a exclusão de pessoas que não tem acesso ao universo cultural global, devemos então pensar sobre que tipos de habilidades estão sendo potencializadas nos contextos formativos. Acredito que isso é possível numa perspectiva critico e emancipatória que busca coordenar as ações não por meio de imposições, mas através do consenso, que por sua vez é fruto de um processo dialógico. É perceptível também que para Habermas, a razão humana não está dada, nem porta uma essência pré-definida. Antes, ela é processual, constitui-se de forma intersubjetiva, na discursividade dos sujeitos que buscam cada qual com sua pretensão de validez, um acordo sobre uma verdade também não previamente dada, mas consensualmente edificada. Nesse paradigma da intersubjetividade, a linguagem se configura no meio pelo qual essa razão comunicativa se constitui.
“A aprendizagem da razão comunicativa no âmbito escolar passa necessariamente pelo desenvolvimento de competências interativas instauradas a partir do diálogo, da comunicação, da crítica, da reflexão, do discurso, da prática pedagógica, do dialogo interdisciplinar, da administração e da participação, entre outras.” (BOLZAN,2002.p.34)
O Fazer e Ensinar filosofia não estão delimitados a um padrão ou a formulas prontas, são ações dinâmicas e modos coerentes ao contexto que se realizam. Neste sentido, a filosofia no ensino médio possui o papel de no mínimo despertar no aluno um olhar novo para o mundo, ela naturalmente gera indagações por permitir que o próprio ser se indague e também compreenda o outro, isto é, por meio da linguagem ocorre abertura à alteridade, ao esclarecimento, amadurecimento e ao dialogo. Para Habermas é preciso instaurar “uma razão comunicativa que reconstrua a educação escolar como um processo interativo com vistas ao amadurecimento da humanidade” (PRESTES, 1997, p.105) no sentido da autonomia. A escola é um local de comunicação, a relação dialógica entre professor e aluno e, alunos entre si em sala de aula, gera abertura para o contato com a alteridade e ao mesmo tempo de formação da identidade do discente, logo, a ação comunicativa ao ser desenvolvida de forma sistemática, coincide com os objetivos de uma educação que tem por meta a formação de indivíduos críticos e participativos. Para tanto, o educador procurará desenvolver no educando a capacidade argumentativa, organizando discursos livres, nos quais seja possível problematizar a fala cotidiana e participar da construção de conceitos e consensos.
A Aprendizagem Dialógica prioriza as interações com maior presença de diálogos, entre pessoas o mais diversas possível, buscando o entendimento de todos e valorizando as intervenções em função da validade dos argumentos. Difere das interações de poder, nas quais predominam relações de poder e o peso da estrutura social desigual. (AUBERT et al., 2008; SEARLE & SOLER, 2004, p. 119).
Conselhos de classe, colegiado escolar, reuniões com coordenações pedagógicas e comunidade escolar, todos esses âmbitos são intermediados pela linguagem, pela comunicação entre docentes, discente e demais envolvida, logo, aprendizagem, nessa teoria, será concebida como a resolução de problemas e conflitos, bem como a articulação de um projeto de vida pessoal.
“Habermas diria que a escola deveria ser efetivamente um espaço público de acesso ao saber, capaz de interagir comunicativamente com os diversos setores que compõem a estrutura de uma sociedade” (BOLZAN, 2005, p. 60).
Convém ressaltar que é no ambiente escolar que o ser humano pode desenvolver estruturas de pensamento que o tornam sujeito de sua história, possibilitando sua atuação no mundo de forma crítica e reflexiva. É exatamente o caráter formativo da escola que faz dela um lugar privilegiado da constituição de seres autônomos, singulares e ao mesmo tempo cooperativos. E para isto, a escola necessita ser o espaço efetivo para ações dialógicas e não para amordaçar. Nesta lógica, os diálogos se realizarão em torno dos conteúdos da aprendizagem e da vida, no compartilhar de palavras onde o consenso ajudará a recriar continuamente o sentido global da vida. Em Habermas, percebemos que ele não há um foco total no processo pedagógico, mas nas estruturas educativas onde ocorre este processo pedagógico, ele foca nos atores (discentes e docentes), pois são eles que fazem as estruturas educativas. É na prática cotidiana da comunicação, na busca do entendimento sem coação, que se configura o processo de libertação da humanidade, pois esta continua a depender da inteligibilidade e da decisão coletiva baseada em argumentos racionais.
Acerca do ensino, sabemos que a filosofia não se limita em discussões temáticas e/ou históricas que se esvaziam ao sair da sala de aula, seu objetivo é que os alunos sejam capazes de andar sozinhos tal como uma criança aprende a andar sem o apoio dos pais, atingindo a “emancipação intelectual”, esse andar “sem auxílio”, significa também a atitude de assumir sua autonomia, sua singularidade. Este é um movimento involuntário e demasiadamente humano, que só é possível para aqueles que se permitem serem atingidos.
“O ensino de filosofia pode ser tomado em uma perspectiva ativa, que tenha por meta a emancipação intelectual daqueles que aprendem, a produção de singularidades, ainda que não seja possível controlar isso” (GALLO,2012a, p. 48).
Durante a aula ler os escritos filosóficos, onde um problema é formulado e toda uma argumentação é efetivada para lhe buscar solução, não é o mesmo obviamente do que apenas ouvir falar sobre os filósofos e sobre as idéias e assuntos que eles abordaram: o texto permite ao leitor pensar com o filósofo, e o docente ao acompanhá-lo na construção fundamentação conceitual. Claro está que tal leitura deve ser feita em salas de aula do nível médio de maneira estratégica, ponderada, e que a leitura dos clássicos não é o foco único das aulas nesse nível de ensino. A disposição de um trabalho com o texto filosófico não quer significar fazer das aulas de filosofia aulas de leitura de texto. A ministração da aula pode ser tanto com a leitura de textos quanto como na utilização de imagens ou versos de algum poema, o importante neste sentido, é a participação ativa dos alunos através da fala (comunicação), exposição de idéias, suas opiniões e conhecimentos acerta do assunto em voga, isto irá proporcionar um ambiente de dialogo e democracia, onde os atores estarão abertos a opiniões e idéias diversas acerca de um mesmo tema trabalhado. Este método de ministração de aula torna o aluno como um ser ativo através da participação em sala de aula juntamente com os demais colegas em exposição de idéias e consenso na troca de argumentos.