A pele que habito

03 de abril de 2020.

"Ame o seu corpo", "Esqueça os padrões", "Se aceite". O processo de amar o próprio corpo é muito mais complexo e difícil do que essas frases de efeito sugerem, e mais fácil ainda é voltar à estaca zero.

Desde muito cedo, entendemos que existe um padrão com pessoas que estão dentro e fora dele, como já estamos fartas de saber. Somos educadas para entendermos isso e acabamos por ver o mundo com os olhos dos outros. Nos é ensinado oq é e oq não é bonito. Quando crescemos, podemos decidir por conta própria. Será mesmo?

Albert Einstein e Schopenhauer dizem que não há liberdade de escolha, visto que estamos sempre, de um ou outro modo, presos a alguma influência interna ou externa, provocada pelo círculo familiar, pelos amigos, pela sociedade. Não há uma só escolha que seja pura e isenta, visto que todas elas trazem alguma ideia anterior responsável pelo seu surgimento. Estamos sempre presos às mesmas correntes imaginárias das nossas tataravós, sem nem mesmo nos darmos conta disso. Portanto, oq é verdadeiramente belo? Temos que ter em mente que a beleza é construída socialmente, visto que nem sempre o "belo" do nosso século, foi o "belo" dos séculos passados. Talvez, devido a isso, seja tão difícil alcançar o ideal de beleza e tão difícil mante-lo. É uma luta incessante que só termina quando entendermos que não podemos alcançar esse ideal de beleza pelo simples fato de sermos humanas, ou seja, imperfeitas, e não por isso menos bonitas.

Se Naomi Wolf resolvesse reescrever o seu livro hoje, não poderia ignorar o impacto das influencers digitais fitness e da adesão capitalista ao discurso sobre body positivity (movimento de autoaceitação), e nós fazemos parte desse processo. A maioria já dentro dos padrões, repetem, incansavelmente, para que a gente se ame. "Eu devo ter algum problema", pensava aos 13 anos de idade. "Porque não amo meu próprio corpo?". Acontece que esse fenômeno, mal sabia eu, ocorre com a maior parte das mulheres nas principais etapas da vida. Se vocês são como eu, também já tiveram questionamentos desse tipo. É difícil não ter essa dificuldade quando vivemos em um mundo obcecado pela aparência física.

Somente aos 20 anos eu entenderia que não adianta, isso só vai nos ferir de todas as formas possíveis. Com o tempo, eu aprendi a me olhar no espelho e a amar o meu corpo, quase que inteiramente. É difícil? Sim, mas não deveria ser. Essa é a sua casa, tão mais SUA do que qualquer outra, então pq não ama-la?

Se os mitos e padrões existem, é necessário, portanto, reconhecer a sua influência na vida cotidiana. Não obstante, é preciso que as mulheres tomem o poder sobre esse mito e passem a definir, elas próprias, os ideais a serem percorridos, independentemente dos padrões impostos de cima.

Mude, mas comece devagar, porque a direção é mais importante que a velocidade.