Essencial

Este artigo visa a comparação entre o livro “Paixões da Alma”, de René Descartes e algumas passagens da obra “O livro dos Espíritos”, de Allan Kardec, no que tangem respeito à diferenciação da essência humana quanto aos sentimentos inerentes a cada indivíduo. Ambos tangem aspectos que transcendem a essência material humana e que serão tratados mais a fundo, no decorrer dessa análise.

Descartes avança adentro da personalidade humana como algo inerente ao ser humano e que se destaca da racionalidade por intermédio das emoções. Ele cerceia que a natureza racional humana deve se sobressair de maneira a apaziguar a influência dos sentimentos – que se manifestados em demasia acabam descarrilhando o norte humano a ser seguido. O filósofo aponta que as “paixões” podem modificar os caminhos humanos e fazê-los tomarem atitudes torpes em sua evolução pessoal.

Por sua vez, Kardec em suas perguntas à dita “espiritualidade amiga” obtém uma série de respostas sobre diversos assuntos, mas nos atenhamos naqueles teores que dizem respeito ao espírito de fato. Em várias perguntas, a espiritualidade responde que as boas ações devem prevalecer no cotidiano do individuo de modo ao processo evolutivo ser galgado rumo a perfeição. Assim, as motivações da “carne” devem ser rejeitadas, pois elas podem corroborar os caminhos a serem seguidos em direção à polidez pessoal e consequente progresso espiritual.

Atualmente notamos divergências comportamentais onde as pessoas agem da maneira que julgam convenientemente individual, não necessariamente coletiva. Vemos atos que beneficiam entes particulares em que prejudicam a coletividade – de maneira ainda mais pungente, se focarmos nossa atenção no cenário nacional e nas manchetes de jornais e revistas sobre a corrupção e desvios de condutas na esfera política. Por que tais elementos não usam do livre arbítrio que lhes foi concedido para praticar o bem ao invés de incessantemente fazer o mal?

Em tempos onde os anseios da matéria têm se sobressaído diante da racionalidade do caráter, o foco de ambas as obras citadas anteriormente parece ter sido abdicado e “convenientemente” guardado no calabouço dos atos coletivos. Ao passo que Descartes sugere não se deixar influenciar por essas questões, Kardec nas respostas que obtém leva a conclusão de que os progressos só serão obtidos por intermédio de expiação e caridade.

Conforme nos aprofundamos na obra do filósofo, vemos que ele sugere caminhos a serem seguidos – similar ao ocorrido em “O Príncipe”, de Nicolau Maquiavel, onde o autor cita uma série de comportamentos de conduta para que as atitudes sejam efetuadas da maneira mais polida possível –onde a direção una da alma não seja deixada pelo caminho e a retidão acompanhe a pessoa durante todos os passos de sua vida. Desse modo, Descartes e Maquiavel sugerem exemplos práticos de modus operandi para que as pessoas demonstrem o melhor de si mesmas caso optem por seguir os caminhos ali descritos.

Por sua vez, o espírita em sua interação nos leva a conclusões de que, se optarmos por ceder pura e simplesmente aos caprichos e desejos da matéria, pouco nos diferenciaremos dos demais animais – ainda que o que nos diferencie dos mesmos esteja presente (raciocínio), parcas diferenças haverá entre nós e eles. Cabe ressaltar ainda que, conforme se avança na prática de boas ações e zelo coletivo, uma progressão e sensação de bem estar pessoal passa a ser parte integrante de nosso cotidiano.

Concluímos que a conceituação da “essência humana” merece análise de diversos pontos de vista, mas, se comparada ao planeta que vivemos, ainda não chegamos ao núcleo. Temos ciência de que a matéria física é perecível e que ainda que esta se torne imobilizada, nossa essência segue maquinando resoluções e mantém-se dotada de raciocínios ímpares (S. Hawking que o diga). Descartes e Kardec nos trazem pontos de vista significativos sobre o que poderia nos ajudar a lapidar nossa essência e, caso optemos por seguir tais ensinamentos e conselhos, tendemos a tornar-nos pessoas melhores e mais conscientes de nossos atos – além de contribuir para o bem estar coletivo.