Adornando a dor depressão

Quem forjou essa dor estava realmente inspirado, pois ela destrói mesmo um espírito.

A boca do estômago cria vida própria, as mãos tremem. Você anda de um lado para o outro da casa, e nada. Lê um livro, assiste um filme, ouve música, e ao mesmo tempo não faz nada disso, pois você não está ali. Seu corpo passa a ter reações que você até então desconhecia. Todos parecem sumir, e talvez tenham sumido mesmo.

Por dentro decanta dolorosamente a densa doença. Você sente os floquinhos de solidão se depositando no fundo da alma, e sabe que não vai passar tão cedo. De repente, dormir se torna um pequeno pesadelo. Uma batalha diária, ordinária. Vã, muitas vezes.

E quando o sono vem, a batalha seguinte é acordar. Parece que aquelas senhoras frias te cercam em volta da cama, se aproximam lentamente e te sufocam. Elas estão lá, a te observar: a solidão, a ansiedade, a dor, a tristeza, e todos seus amigos e amigas horripilantes, vestidos com cores de depressão.

Custa a aparecer a coragem, e Deus, ah Deus! Deus te olha de longe. Mas te olha.

E pode ser que Deus, ou uma versão diferente de você mesmo, ou mesmo o mero acaso, lhe façam uma surpresa. Quem sabe, numa bela manhã de sol, algo o faça olhar pela janela e ver, justamente, o sol. Talvez a paisagem seja bela, com alguma árvore, flor ou criança a correr e gritar. O mundo material está ali e você está vivo. Tem sangue dentro de você.

Aquelas senhoras tristes e medonhas começam a perder a força e você, nesse dia de sol, talvez até levante. E se você levantar, meu caro amigo, por dentro e por fora, vai começar a reaprender a lição definitiva.

Assim me falaram sobre ela, a lição definitiva. A lição que a morte, tão desprezada, é incumbida de lembrar aos homens todos os dias.

Tudo passa. Todas as coisas passam. É melhor estar bem para vê-las passar.