OCUPAÇÃO
No mundo atual industrializado, o enfado é um fato relevante e comum na vida na sociedade, onde a pergunta se estende a uma questão mais ampla e intrigante.
Num momento tão pleno de coisas e eventos inovadores e emocionantes, estamos mais sujeitos ao tédio do que nunca. Antes de tantas inovações, como a internet e outros artefatos virtuais, jogos eletrônicos e realidades prontas, éramos capazes de criar mundos a partir de quase nada e tínhamos uma vida mais simples, quando a imaginação e a improvisação proviam na ausência dos aparatos modernos. O tédio parecia ser mais controlado, com menos expectativa de novidades. De lá para cá, foi uma longa jornada.
Parece ser um truque de memória, até certo ponto, pois, é difícil lembrar o vazio. Contudo, possuir mais bens não alivia o tédio que, oposto ao contentamento, não é quantidade, mas equações, e representa, nessa lógica, a falta de relação com o que temos, pois, é um vazio do coração.
Atualmente, os produtos e subprodutos são aperfeiçoados em seu acabamento, até nos brinquedos de criança que se parecem em todos os detalhes com um carro, avião ou navio real, dispensando a necessidade de imaginação, relacionando a criança como proprietária manipulando o brinquedo em torno da ação indireta, distante e sem envolvimento. Isso não constitui uma experiência, mas, o resultado fatídico do produto de nossa civilização alicerçada no conhecimento desfavorável à experiência, produzindo o tédio, pois, a propriedade não satisfaz o coração.
A reflexão, se realmente pode alcançar a nitidez, por sua própria natureza, antecipa a experiência, o que implica na sua secundarização. Da mesma forma, temos a ênfase desigual no dogma, que impera até hoje. Daí, a abundância de teologistas e a escassez de teólogos, pois, o conjunto harmônico de leis da inteligência ativa e onipresente, transformadora e ordenadora que comandam o universo, cujos logos não operam nessa conjectura, mas, apenas nas categorias da lógica que se realiza no pensamento humano, se concretizam num viés que não afeta somente o conhecimento, mas, se faz presente, também, em todos os lugares e em todos os níveis.
É provável, que o racionalismo endêmico que falha em sustentar a imaginação espiritual da igreja, seja responsável pelo enfado que motiva o díscolo e a dissidência dos fiéis, porque a crença lhes é apresentada como um produto aperfeiçoado, os incentivando somente ao chamado de declarar que a fé é patrimônio deles.
Mas, a religião é o que fazemos com a nossa solidão, quando entendemos que o Espírito está sempre se movendo na Igreja, em nosso corpo, e a fé, nosso relacionamento com Adonai, é o que realmente importa.
Não é tarefa fácil evitar o tédio! Todavia, podemos manipulá-lo, dando uma expressão à nossa vida usando esse vazio para recebermos uma purificação e uma abertura de espaço para algo novo nascer, pois, no equilíbrio tudo é reunido, sem a necessidade de sempre rearranjarmos o que já temos.