Histórias musicadas
Mania de eternizar amores em canções. Tenho uma relação de cumplicidade com certas letras e melodias. Parceria com diversas composições, como se elas fossem as pessoas que já transitaram pela minha vida. Afetos múltiplos. As músicas acabam se tornando, de fato, a presença sentida do outro. O problema é que o segundo se vai com o tempo, já as primeiras ficam para sempre. Como esvaziar toda a carga emocional depositada naqueles dizeres musicados, cantados? Permanece a lembrança viva, difícil de ser apagada. O que resta é o dilema entre o grande prazer de escutar a canção e a negação de revisitar as memórias deixadas para trás. Um dia, muito bem semeadas, regadas e cultivadas. Dadas. Compartilhadas. Hoje, meros fantasmas. O próprio medo de ouvir e vê-las na minha frente, esperando algum tipo de reação. Receio de reviver, por alguns instantes, histórias já concretizadas, mas que estão, neste momento, rasuradas. Forçosamente, temendo o indício de qualquer chama acesa. Tudo diz tanto e nada, ou pouco, realmente, atinge, visto sermos semipermeáveis. Fantasia de querer aquilo que é impossível, em termos românticos, entrelaçada com a impossibilidade do desejo latente e reconfigurante. E a faísca se confunde com a assombração do passado. À medida que nos abandonamos, desatamos nossos sentimentos, procuramos esquecer as tais canções. Se escutadas, vez ou outra, estão passíveis de inúmeros riscos. Talvez, não sejam nem terminadas. Podemos ser atropelados. Quem sabe a verdadeira cura resida em ouvir aquela música até o fim!