Natal

Desconfio que não gosto do Natal, sempre idealizei a data, minha família e mesmo com essa desconfiança não consigo parar de idealizar. Talvez por idealizar não goste, idealizações nunca são alcançadas, só servem para nos frustrar, para nos castrar e em última instância para nos mover.

O ar do Natal é nostálgico, quente, abafado, úmido, tudo tão estranho.

Fotos de família, pessoas usando vermelho, neve no sertão, pessoas sem tretas, mil mensagens disparadas (aposto que ninguém ler) todos fingindo costume, quase um delírio coletivo. O ar do Natal é mais hipócrita.

Não consigo entrar no clima (não por ser menos hipócrita), eu até gostaria de entrar no clima, é terrível não entrar no clima. O ar do Natal é pesado de tanta culpa.

A noite de Natal ou melhor todo o mês de dezembro é sufocante, todo mundo querendo fazer as pazes, mil confraternizações, obrigação de encontrar os parentes que já não se tem contato, carregar a culpa de assumir quem você é e não mandar mensagem compulsivamente para todas aquelas pessoas que você um dia conheceu só porque sua cabeça já não ta tão bem, após toda a lavagem cerebral da mídia. 365 dias não valem mais que um dia? O ar do Natal é fantasioso.

Acho que o Natal contemporâneo é falta da falta, é angústia e talvez por isso se encham de tantos enfeites, penduricalhos, se encham de mensagens, neve de mentira, de comida, para encher os buracos, onde não se pode notar que não se tem algo, que se estar vazio, que se tem falhas, que não se é completo. Ninguém quer parar para pensar então se enche tudo. Natal é estar cheio de nada.