Carnaval que nunca chega

Ainda pareço estar presa à um lugar atemporal da existência. Onde tudo flutua numa atmosfera etérica insuportavelmente tépida. Tudo paira vagarosamente numa velocidade invisível à olho nu, ao passo que o resto da sociedade continua no ritmo devido, a grama e as crianças continuam crescendo, os velhos ficando doentes, a presidência sendo sucedida por outro corrupto[...]. E aqui, nenhum ruído doce ou estridente. Silêncio total, é onde absolutamente nada acontece. Esse silêncio só é quebrado, muito ocasionalmente, por um profundo suspiro que não se pode dizer se é de tristeza, cansaço, tédio ou o que. O olhar fundo e longínquo como quem aguarda algo sem previsão, a face que parece ter desaprendido qualquer expressão. Até rir ou chorar da própria miséria, como costumava ser em outros tempos, deixou de existir para dar lugar à uma indiferença palpável. Pela manhã sento à soleira da janela e me coloco a articular como passarei as horas seguintes do dia de modo que não enlouqueça de vez. E às vezes quero enlouquecer de vez também. Mas aqui não existe desespero, e também não existe euforia boa. Não existe sentir pena de si, assim como não existe o coração palpitando de alegria. Que lugar fui me meter, meu caro...!