SOLIDÃO... PRÊMIO OU CASTIGO?
Os seres humanos, ao longo de toda a sua vida, percorrem naturalmente, uma trajetória evolutiva, e vão acumulando um repertório de conhecimentos e experiências, seja por vivenciá-las e ou por meio da observação e do raciocínio. Aqui podemos inserir o conselho do sábio, para que aprendamos também com os erros alheios, pois não teremos todo o tempo disponível para cometer todos os erros sozinhos.
A aquisição de conhecimentos e experiências se desenvolve por dois canais: o canal da racionalidade, que se abre de início no âmbito familiar, e progride através do ensino escolar, em ambos os estágios acumulando paralela e simultaneamente os conhecimentos e experiências absorvidos no convívio social, de um modo geral. O hábito de ler, de explorar habilmente a Internet e o próprio comportamento característico daqueles que se interessam em obter conhecimentos, complementam os caminhos que conduzem as pessoas a encontrar o que procuram, e a obter uma visão mais ampla e mais profunda sobre todas as suas próprias circunstâncias. Esta sequência, porém, se ajusta apenas à obtenção do conhecimento racional, que pode ser transferido e absorvido entre os indivíduos, de acordo com as suas potencialidades.
Com relação ao conhecimento espiritual, a questão é mais complexa, e já de início, muitas pessoas nem sequer acreditam na existência desse tipo de conhecimento, mesmo porque ele é essencialmente abstrato, incomunicável ou intransferível entre as pessoas, cuja obtenção se escoa pela intuição, oriundo de insights espirituais proporcionados pelo Espírito de Deus, e de acordo com a sua profundidade, às vezes o próprio agraciado encontra dificuldades para a interpretação, valendo-se muitas vezes dos escritos dos Profetas e de outros mais avantajados espiritualmente, como Jacob Boehme por exemplo, aproveitando as similitudes das suas intuições, para obter e consolidar a sua própria compreensão.
O avanço muito profundo e acentuado do conhecimento, seja ele racional ou espiritual -neste o fenômeno é maior- provoca um afastamento do seu detentor, com relação às outras pessoas, provocado pelo conhecimento que não pode ser compartilhado, independentemente da vontade do seu possuidor. Aí ocorre o nascimento da solidão, que aumenta na mesma progressão do conhecimento, e é o preço a ser pago pelo conhecimento racional, e parte do preço a ser pago pelo conhecimento espiritual, ao qual serão acrescentadas as provações nos moldes de Jó. Ambos os tipos de solidão têm um ingrediente comum, como agravante paradoxal: quanto mais profundos e complexos forem os conhecimentos, menos serão os indivíduos que poderão compreendê-los, intensificando a solidão. O período do solitário é longo, Jacob Boehme levou doze anos pagando o preço, e conhecemos outro que se aproxima dos dezoito anos. É preciso ter a paciência de Jó, mesclada com a sabedoria de Salomão.
O filósofo brasileiro Huberto Rohden (1893-1981) enaltece intensamente a necessidade de mergulharmos no nosso próprio interior, deixando de lado o ego e entrosando-nos com o Eu, com a pretensão de desenvolver o Ser e não o Ter. Esse é o caminho da introspecção, que exacerba a introversão e também o isolamento, mas aumenta sensivelmente a possibilidade da eclosão dos insights espirituais mais profundos. Nesse contexto podem ser inseridos os preceitos da meditação.
“Infelizmente, uma tradição teológica de quase dois mil anos destruiu no homem ocidental a consciência de que “eu e o Pai somos um”. Desde pequenos, fomos ensinados que o homem é mau, pecador, filho do diabo, etc. É que nossos mestres espirituais eram “guias cegos guiando outros cegos”. Identificavam o homem com o seu ego negativo e não com o seu Eu positivo; aprenderam no Gênesis que o homem é pó, - mas não leram no Evangelho que o homem é “luz”, “espírito”, “Deus”. Ótimos discípulos da escola primária de Moisés, nunca se matricularam na Universidade de Cristo. Por Moisés foi dada a Lei; pelo Cristo veio a Verdade, veio a Graça. Lei é escravidão – Verdade e Graça são liberdade. Lei é ego – Verdade e Graça são Eu”. Huberto Rohden
O homem natural não aceita as coisas do Espírito de Deus, porque lhe são absurdas, e não pode entende-las, porque se compreendem espiritualmente, mas aquele que é espiritual compreende todas as coisas, ao passo que ele mesmo não é compreendido por ninguém. (I Coríntios 2:14,15)
Contudo, apesar do preço a ser pago, nunca se soube de alguém que estivesse disposto a sofrer um apagão nos seus conhecimentos, em troca da devolução do preço pago: a solidão e as provações. Talvez porque o conhecimento racional mais avantajado proporciona maiores vantagens materiais, e o conhecimento espiritual mais amplo e profundo pode esclarecer quem somos nós, de onde viemos, o que fazemos aqui e para onde vamos, e ainda nos revelar quem é Deus, esclarecimentos que a humanidade persegue desde que adquiriu a capacidade de raciocinar, e que através da racionalidade jamais conseguiu alcançar, e ainda, o principal, que se inclui no novo nascimento espiritual: a salvação pela Graça!
Não fostes vós que me escolhestes; pelo contrário, eu vos escolhi e vos designei a ir e dar fruto, e fruto que permaneça, a fim de que o Pai vos conceda tudo quanto lhe pedirdes em meu nome. (João 15:16)
Porque pela Graça sois salvos, por meio da fé, e isto não vem de vós, é dom de Deus; não vem das obras, para que ninguém se orgulhe. (Efésios 2:8,9)
Definitivamente, o maior desejo do ser humano deve ser o de que ocorra, pela Graça, a sua inclusão em I João 2:27, para que obtenha o “passaporte” indicado em João 3:3,5. Embora a salvação não venha das obras, pois não existe um justo sequer, parece evidente que as escolhas não recairão sobre os maus, classificados como “joio”.
Jesus lhe respondeu: Em verdade, em verdade vos digo que ninguém pode ver o reino de Deus se não nascer de novo. Em verdade, em verdade vos digo que se alguém não nascer da água e do Espírito, não pode entrar no reino de Deus. João 3:3,5.
Mas, como cuidado e caldo de galinha não fazem mal a ninguém, é conveniente observar: Tende cuidado com os falsos profetas, que vêm a vós disfarçados em pele de ovelha, mas interiormente são lobos devoradores. (Mateus 7:15) Para concluir, devemos nos lembrar do dito popular: “Antes só, do que mal acompanhado”, e neste caso, bendita
solidão!
"A sociedade enriquece a mente, mas a solidão é a escola do gênio". Edward Gibbon. (1737-1794) - Escritor (historiador) inglês.