A Comunidade Fraterna

A filosofia “Patrística”, sobre todo depois do Concílio de Niceia (325.d.C), com figuras de destaque como Círio de Alexandria ou Atanásio, fora a encarregue de situar ao Homem como centro do Universo. Aquele para cujo beneficio todos os reinos da natureza foram criados… Deixando assim aberta a porta, a interpretação do resto dos reinos, da natureza, estarem à mercê da realização final do ser humano… Dai, posteriormente a falsa visão negativa, do ser humano ter tudo o direito de pose e utilização dessa rede natural da vida em seu pior beneficio. Desde o século XVIII: o estritamente económico – material.

Matando a velha visão holística, da inter-relação e interdependência das partes, dentro do todo. O qual representa, que afetar uma das partes, afeta imediatamente o equilibro de toda a rede natural, afetando finalmente a esse mesmo ser humano. Ser humano que substituiu sua missão de guardião do planeta, pela de dominador ególatra do mesmo.

A perceção “Patrística” deixa de lado, abandona, os velhos ideias da tradição naturista grega e do neoplatonismo, onde figuras em destaque como Plotónio, Porfírio ou Jâmblico, põe no centro a Transcendência dum Deus Uno ou Inteligência Universal, que por emanação cria a nossa profana realidade. Uma visão tirada dos aspetos mais espirituais e cosmológicos, da doutrina platónica, misturada com a influência das filosofias egípcias e judaicas – com as quais tem contacto através da Área Mediterrânica, que finalmente se vai transformar num novo centro irradiador duma nova conceção do mundo, durante o século I e II da nossa Era. Estas filosofias transcendentalistas, mas também naturistas e holísticas, dos filosofos gregos da natureza, como Anaximandro, para o qual a Terra era um ente, dentre vários, surgidos do Uno-Infinito, no qual todos aqueles entes se dissolviam. E, aquela fisolofia pitagorica, que não somente conciliava ciencia e espiritualidade, senao que assim mesmo, compartilhava em igualdade os conhecimentos, entre homens e mulheres. Prova disso foi a Mestra de Pitágoras, a grande filosofa, matemática e sacerdotisa Temistocléia. Os pensamentos desta escola, assim como os socráticos, platónicos e mesmo aquela visão de disciplina e ajuste a Lei, criada por Solon de Atenas, passaram ao formar parte do posterior, mundo neoplatónico. Lembramos aquela Eunômia de Solon, um dos 7 sábios da Grécia. Eunômia (relacionada com a filha de Zeus e Têmis, do mesmo nome, uma das guardiãs da natureza; personificação da Lei natural), foi a forma simbolica em que Solon, aplicou a lei social, a lei natural, que indica o caminho do meio – afirmado em seu dia pelo Budha. Eis aqui por que aquela Trindade neopitagórica, defendida por Numênio de Apameia, no século II, encaixava melhor nas mitologias antigas dos povos, a Oriente e Ocidente. Sendo que ela exerceu uma influencia considerável em autores como Plotonio e no, posterior, neoplatonismo.

Mas a pesar deste neoplatonismo, ter passado, de algum modo transferido parte de seu saber a filosofia “Patristica”; esta nova perceção da realidade, imposta sobretudo após o Concilio de Niceia, vai ir derivando cada vez mais, num corpus concetual, favorável a consolidação da Roma Material Imperial, afiançada na Matriz do Novo Cristianismo desposuído de toda profundidade espiritual. Manobra geopolítica orquestrada por Constantino. Apesar de autores como Santo Agostinho ou Boécio, ter sido influenciados pelo neoplatonismo; a versão final do cristianismo após 325 d.C, quebra com esta centralidade holística no Ocidente, assim como com a velha aliança material – espiritual, que reinava na Europa, desde o domínio dos druidas celtas. Já Roma desde Augusto, vinha rumando na ascendência do material, em detrimento do espiritual, no entanto manter vivos os símbolos da mitologia grego latina, mas utilizados em serviço do centro político material imperial.

Ainda assim a visão neoplatónica seria resgatada, quando na Idade Media, os pensadores islâmicos e judeus, tiveram a bem a incorporem as suas filosofias. E a Trindade defendida por Numênio Apameu, voltou aparecer, trás a ponte criada pelo Islão entre Oriente e Ocidente.

A Trimurti indiana, tinha aquela similitude, que a ninguém lhe pode ser indiferente, com o trisquel celta, e a trindade babilónica ou egípcia.

O gnosticismo, herdeiro dos essênios e nazaritas, e dos judeus fugidos para Alexandria, quando a IIª queda do Templo de Jerusalém, em 70 d.C – vinha também impregnado da cultura helenística, que marcou os preceitos do neoplatonismo. As teorias neopitagóricas, de Apolônio de Tiana, no século I, iam contribuir para confluência no mesmo corpus. E aquele corpus filosófico, teve de esconder-se e escapar de Niceia, e das manobras de Constantino, para criar junto a Lactancio e Eusébio de Cesareia, um dogma favorável ao centro material romano.

Isto, não era uma exceção na historia, senão um continuo, pois já os essênios, tiveram de esconder seu saber, desde que os exércitos rebeldes dos Macabeus tomaram o controlo de Jerusalém, e reconsagraram o Templo, dentro da guerra da independência contra o Império Selêucida. A partir dai os Essênios rumam a Qumrã, local onde resguardam seu saber das agressões do mundo.

Foram precisamente estas filosofias, e mais essencialmente estes modelos, modos de viver a espiritualidade, num ambiente de igualdade, de fraternidade e comunhão com a natureza… As que criaram os modelos comunitários, dos que iam beber os primeiros cristãos. Estes, mais tarde iam espalhar estas teorias, desde a Alexandria, local de acolhida, deste judaísmo proscrito (germe do cristianismo), desde a destruição do II Templo de Jerusalém, por Tito; ate a expansão pelo resto do romano império.

Chegaria a Galiza, essa ideia de comunidade fraterna, no século IV da mão do Grande Prisciliano. Primeiro mártir a ser executado por um tribunal eclesiástico de carácter inquisitorial. Os cátaros beberiam da mesma fonte, correndo a mesma sorte… Ate a deturpação final do cristianismo e a vitoria definitiva dos seguidores de Niceia. Mas em pequenos grupos, fechados, a verdade ainda foi e é preservada, a espera do grande dia da definitiva comunhão dos seres humanos, entre eles e com a natureza- Fim do Ciclo Negro da Guerra – da Idade do Ferro, que todavia prevalece…

“Por mim discerni uma certa sublimidade na disciplina de Pitágoras, e como uma certa sabedoria secreta capacitou-o a saber, não apenas quem ele era a si mesmo, mas também o que ele tinha sido; e eu vi que ele se aproximou dos altares em estado de pureza, e não permitia que a sua barriga fosse profanada pelo partilhar da carne de animais; e que ele manteve o seu corpo puro de todas as peças de roupa tecidas de refugo de animais mortos; e que ele foi o primeiro da humanidade a conter a sua própria língua, inventando uma disciplina de silêncio descrito na frase proverbial, 'Um boi senta-se sobre ela.' Eu também vi que o seu sistema filosófico era em outros aspectos oracular e verdadeiro. Então corri a abraçar os seus sábios ensinamentos…”

(Apolônio de Tiana).