Sobre amor e liberdade

Certa vez encontrei um passarinho ferido, tão ferido quanto eu, e decidi cuidar dele como gostaria que cuidassem de mim.

Levei pra casa, cuidei das suas feridas, lhe dei de comer, de beber, lhe ofereci lugar seguro e todas as manhãs repetia a mesma rotina de cuidado e carinho assistindo ele se recuperar e crescer mais forte e bonito.

Seu processo refletia o meu que também se encaminhava para cura de feridas dolorosas e isso me aproximava cada vez mais dele.

Passamos longos meses juntos até eu perceber que aquele passarinho já recuperado não cantava mais tão feliz. Me preocupei, tentei entender e não demorou muito pra chegar à conclusão de que lhe faltava algo extremamente importante: a liberdade.

Relutei um pouco, admito. Não quis abrir a porta da gaiola por preocupação, por medo dele não voltar mais, dele se perder, de não saber se virar, de alguém machuca-lo ou prendê-lo por maldade... mas tudo isso escondia meu medo de ficar sem ele. Eu o amava muito pra lhe deixar ir e achava que preso ali ele estaria mais seguro, que essa era a minha forma de mostrar amor de verdade, protegendo ele, lhe dando o que eu achava que lhe bastava, lhe mantendo perto de mim porque eu sim sabia cuidar dele.

Pensei e agi dessa forma durante muito tempo até perceber que esse meu amor estava matando aquele passarinho. Amar é cuidar sim, é ajudar a curar as feridas e proteger o quanto puder dos males que venham atingir aquele ser mas, sobretudo, é entender e aceitar a liberdade do outro. É não ter medo de abrir a porta e deixar ir porque no fim amar é querer bem mesmo quando esse bem não é mais do nosso lado.

O egoísmo, o medo de perder, o ciúme e a insegurança nos fazem esquecer que não somos nós quem decidimos o que faz o outro feliz e como ele deve viver essa felicidade. Com isso criamos gaiolas bonitas e colocamos alguém lá achando estar protegendo e agindo de forma certa mas por mais luxuosa que seja, por mais conforto e regalias que apresente, uma gaiola não deixa de ser uma gaiola.

O amor de verdade deixa livre porque sabe que independente do que aconteça ele vai continuar existindo e que se ele conseguiu de fato plantar sua semente no outro ela vai germinar, crescer e florescer da maneira mais linda possível lhe tornando eterno e sempre possível independente do tempo, da distância e de qualquer outro obstáculo.

Deixei ele ir. Não sei se ele vai voltar.

Mas é reconfortante saber que o amor permanece ativo tanto pra quem fica como pra quem vai e que isso é o que nos garante uma passagem de volta quando quisermos ou precisarmos voltar.