ITINERÁRIO ESPIRITUAL
Não sei o que fazia
Só sei que obedecia
Recebi o desejo na tenra idade de à Deus agradar
De trilhar seus caminhos, suas vontades
Fui colocado como herdeiro de Deus
E fui educado a cumprir o que para Deus servia
Vida era fazer do divino a Lei
Era seu estatuto, esse era o homem bom que procurava ser
Para mim sentia a decora-me o que de meus pais recebia
A instrução de agradar à Deus
De fazer com que a conduta fosse à fonte que controla a ira divina
Permeado de normas e leis viam-me apenas obediente
Fazendo da vida a vida que Deus quer
Fazendo de mim a materialidade dos imperativos divinos
Vida para mim era trilhar os códigos celestiais
Estava certo de que só tinha sentido a vida assim
Era homem decorador de como agir
Normas celestiais eram a diretriz humana para amenizar a cólera celestial
Via-me assim e via Deus também
Uma fonte invisível de poder que se contrariado fosse teríamos arrependimentos
A vida era paupérrima a minha percepção, nosso destino era servir ao cruel Deus
Interpretava o divino assim, que fazia da minha submissão seu orgulho
Que era dono de percepções de ira aos que se opunham ao Seu Estatuto
Fui educado assim
Foi germinada minha personalidade assim
Meu caráter era ser subserviente ao divino
O medo era a fonte do serviço que inundava minha essência
Assim era a vida, condenados ao Deus massacrante
A vida era assim, nossa sina era a escravidão ao poder celeste
Vivia sitiado de receios fazendo do Estatuto a diretriz para continuidade da vida
Assim subi no monte, levando medos e obediência
O filho meu que respirava era destinado a cessá-la por ordem celestial
Assim só sei que subia o monte, levando submissão e comprometimento
Era o certo a se fazer, era o sacrifício que suavizava a ira de Deus
Não via nada além disso
Enxergava o medo como entrave da inteligência
Como o combustível para se estar ali
Era envolvido pelo desejo de agradar à Deus
E por mais que me doía, era preciso, era de Deus aquela cena
A ambivalência me sitiava o momento
Sofrimento e medo eram o maior vilão de meu ser
Não via outro Deus, apenas o Deus Estatuto
Não interpretava de outra forma
Só sei que obedecia
O ar de inocência que germinava de meu filho aumentava a dor
Dilatações de loucuras cercavam meu ser que só sabia obedecer
Não me rebelava afinal o imperativo era da divindade
No ápice da agonia o cume me fazia dilúvio em emoções
Sentia desespero que escamoteava a razão e explicitava o Estatuto
Na culminância da leviandade o sacrifício fazia-se materialidade
Na agonia meu Deus eu obedecia
Quando o medo ergueu meu braço a voz divina fez interdição
O alívio inundava doravante meu ser
Não entendi o bradar de Deus
Será que fiz alguma coisa errada?
O medo ainda revestia-me
Confusão habitava meu ser
Por que pediu para cessar o sacrifício?
O paradoxo existencial agora me envolvia
Será Deus de outro modo?
Por que o Estatuto iria cumprir
Nada se dava fora de mim, às normas desde infante seguia
Deus se arrependeu do sangue de meu filho?
Estava mergulhado em contradição
Desci o monte Moriá e descendo o nível de dor em consonância
Deus impediu-me do maior episódio da vida
Iria lembrá-lo sempre, mas com o alívio do Estatuto
Mas a partir daquele dia não fui mais o mesmo devido à interdição da ordem
Descobri que estava imerso na imagem de um Deus cruel, que faz de seu poder a fonte da Sua soberba
Ele não pode ser pior do que eu
Não pode ser a raiz principal da imaturidade
Não pode comportar os deslizes humanos
Não pode ser detentor da mentalidade fútil dos humanos
Deus não pode ser a fonte das imundices humanas
Ele não tem condição de ser em transcendência tudo que é mazela humana
Estar além de códigos de conduta
E percebi que estava errado, logo o desejo de conhecer Deus sem os medos que me envolvem foi sendo germinado
Entrei neste itinerário, descobrindo gradualmente um novo Deus
O Deus que estava no subterrâneo do meu medo
Deus que era a fonte da sabedoria, Deus que tem amor
Tudo isso era a riqueza que fui percebendo neste caminho existencial
Mudando aos poucos a hermenêutica da divindade
Sofrido e libertador processo, fui herdeiro de uma percepção equivocada de Deus
Neste itinerário as marcas da crueldade de Deus iriam se desfazendo, o Deus cruel foi ganhando a roupagem do amor
Logo foi-me apresentado misericórdia
Sentia o vento da percepção ser brisa para a ação de Deus
Os estigmas do medo que me levaram ao monte iam se despindo aos poucos
Passei a ver além da Lei, comecei a ser o húmus da reação de Deus por minha ação
Vi transcendência, e senti-me renovado a vida
Ao longo do processo vi um homem cercado da multidão furiosa com pedras nas mãos
Bradavam justiça e compreendia seus direitos e gritaria
Mas o homem disse palavras que eu não disse no monte e o sacrifício também foi interdito
Estava mais uma vez envolvido em contradição
Todos saíram da cena, vi o homem olhar para mulher em sacrifício de modo apaixonante
Parecia que a conhecia, e deu-lhe palavras de redenção
Fique intrigado, o Deus carrancudo iria se desnudando da minha percepção
O Deus do amor iria sendo plantado no meu ser
Vi a vida de outro modo
Tal homem era cercado de pessoas paupérrimas na cultura e riqueza
Não era de caráter soberbo, vivia em lugares inóspitos onde a lama social colocava os indigentes
Parecia de olhar compenetrante, dizia palavras em eloquência nunca dantes vistas
Colocava poesia nas falas, e o acolhimento no abraço
Era dono de um sorriso redentor
Parecia que gostava de estar onde estava, parecia ser irmão de todos que o sitiava
Falava com mansidão, parecia envolver a humanidade dos que estavam próximos em amor
Aglutinava afetos pelos indigentes, e jantava com ladrões, o que me colocava em abismo de contradição
Ele era manso nos gestos, e falava de um reino dentro do homem
Bradava pureza nas palavras e olhar, era veemente de ternura
Colocava humanidade no Estatuto, misericórdia aos errantes
Fazia das tempestades da vida o território da primavera sapiencial
Colocava doçura no comportamento, envolvia- se de compaixão
Tinha preferência pelos rejeitados, habitava a imundice social
Meu ser crescia vendo seu comportamento, parecia que o Deus da guerra era desfeito e o Deus amor era-me apresentado
Ele era ousado, dizia Ser filho do todo poderoso
Confundindo mais ainda minha condição porquanto era contrário o Deus cruel lá do monte
Mas a angústia da interdição do sacrifício do monte abriu lacunas para o que o homem dizia
Pois não podia compreender que Deus queria a morte de meu filho (ISAC)
Não podia julgar que Deus me pedira atos cruéis
Não podia aceitar que a morte era a sentença da desobediência
Não podia enxerga um Deus cruel, não podia servir as loucuras celestiais
Talvez ele quisesse ver-me contrariá-lo
Só agora esse homem me fez ver meu passado de um jeito novo
Compreendia que Deus poderia pedir a morte como o algoz do Estatuto
O homem que habitava o inóspito fazia enxergar à vida a luz do amor
Ele encorajava os doentes, redimia os errantes da vida da promiscuidade
Vivia com os desprezados pela Lei, Bartimeu foi vitima do seu amor
Zaqueu foi visitado pelo seu amor a refazer sua vida, incorporar o comportamento e o desprendimento que suas palavras diziam onde os felizes eram os puros de coração.
Foi no alto de outro monte que revolucionei minha imagem de Deus
O Deus do monte Moriá me levou ao ouvir o Sermão do Monte que colocava em contradição meus preceitos farisaicos
Assim a revolução interior foi me libertando das amarras da Lei e fui sendo visitado pela redenção das palavras do homem de Nazaré
Que foi o semeador do melhor que eu poderia ser, o que estava escondido na infertilidade da Lei fez-se fértil pela fertilidade do amor
E assim ele falava das “tarde das sombras” onde seria o regador do ele havia plantado em mim
Germinando vida nova pelo seu sangue
Assim o Deus cruel do monte Moriá se desfez e o amor era o alicerce de Deus que passei a enxergar
O itinerário foi desafiador, das contradições passei a ver Deus do jeito certo
Todo envolvido pela luz do homem de vestes pobres e santas que me fez ser a luz e o sal da terra
Era o pastor dos valores, o pastor da redenção, o pastor da vida que me conduziu a luz do que posso ser
A luz deste homem era o reluz no ápice da cruz sendo seu divino nome Jesus
Foi o autor da revolução do Deus para mim e levou-me a contemplar as belezas da vida
A simplicidade da humildade, a poesia dos lírios dos campos, a dignidade entre o joio e o trigo de minha essência
O amor era a fonte da humildade de seu caráter, sendo o agricultor da temperança
Era a magia e felicidade de cá estar, sendo a opulência do perdão que encontrou não uma prostitua, mas uma mulher sob a mira de pedras e da Lei como testemunha
Era a fonte da vida que fazia das coisas simples a divina epifania de redenção, tendo como testemunha a mulher samaritana
Fazia de si o amor que manifestar Deus ao mundo
E com ele Deus foi renovado em mim, sendo o amor o aprendizado da vida através deste itinerário de redenção
Por que este homem via através das aparências, enxergava a redenção além da vida
Fez de si o modelo de Deus e me fez mergulhar no amor pelo caminho sapiencial das imperfeições
A fala daquele homem fez-me ver além de mim mesmo como humanidade e fez-me ver que do amor Deus era a realidade.
Renato j