Trago-me
Já é fim de tarde, numa tarde tão fria quanto as noites de inverno, mas, ainda assim, tão clara como os primeiros dias de janeiro.
E eu caminho lentamente pela rua onde moro, com um cigarro já pela metade entre os dedos e o corpo cansado de um dia que pareceu interminável.
Assim como o cheiro do cigarro impregnado entre meus dedos indicador e médio, em minh’alma carrego impregnada a mania de questionar a todo momento se estou no caminho certo.
Não que exista um caminho certo, talvez sequer haja caminho.
Mas aquela mania de corroborar tudo que minha consciência lapidou, não me deixa chegar em casa e sentar no sofá, vendo a vida passar, sem pensar que algo está errado.
Hoje, já passando da terceira década de vida, acredito que minha ficha já tenha caído e que aquela petulância adolescente de achar que o mundo se moldaria às minhas vontades tenha dado lugar a uma resiliência quase que suicida.
Talvez seja só o reflexo de um dia cansativo, um lapso ocasionado pela rotina que virou mania e por ter notado que, por tantas vezes, fiz o mesmo caminho, no mesmo ritmo, sem sequer notar.
Amanhã, talvez, o dia seja menos extenuante e não me faça lembrar que a vida deve ser vivida todos os dias.
Assim como o cigarro que acabou de queimar-me os dedos e me fez lembrar que, pensei tudo isso, sem sequer aproveitar seu último trago.