L'Enfant Terrible

Você foi à escola com medo. Aquilo afastaria-te de teus pais. Tiraria você da Zona de Conforto do Lar, conduzindo-te à Zona de Confronto Escolar. Ali, um palco para ações públicas, encantamento, desencanto, tarefas várias, aprendizado forçado (anos 80, né? Esperavam o que?)

Aquela cena do garoto, na hora do intervalo ("recreio", para alguns), vindo, com uniforme escolar, pegar a bola com o pé, aparecendo a ti na porta da Secretaria que conduzia ao Pátio, em tua primeira ida ao Colégio, em fevereiro de 1984, foi uma das mais marcantes em tua vida. "Foi uma cena inaugural", você o diz, para si mesmo. E para quem mais quiser saber. Ele fez um sinal de positivo, num aceno amistoso a ti. Isso te marcou de modo atemporal. Registrou-se na Eternidade. Você queria reencontrá-lo e conversar com ele sobre isso. Saber quem ele era, seu nome, se ainda mora no Brasil. Talvez você o reencontre na rua. Mas jamais saberá se era ele ou não. O tempo, para ti, Wellington, não passou. Talvez não passe nunca. Os rotuladores de plantão não passarão. Eles estão condenados a viver na superfície do que a vida deixa amontoar. E, no livro da Vida, as páginas palimpsestas sempre terão vez. Faz parte da estratificação social.

"Isso [escrever] te faz bem ou faz mal? É uma forma de terapia?"

Não o sabes. Apenas escreve. Ainda estás preso no tempo, lá, no Colégio Municipal. Em 1984. Com teus sete anos de idade. Esse doutorado que tanto persegues, sabe o que é? Um desejo íntimo, um sonho de conciliar, de celebrar um acordo entre o adulto leitor, pesquisador, professor, com a criança que sonhava em ser cientista. Assombrava teus professores do Primário (não aceitas as definições atuais de "Ensino Fundamental" e afins que por ora se afiguram como assim as definem, numa convenção política que, a despeito de dar novas classificações aos níveis de formação escolar, sequer demonstram preocupação em mudar esse quadro): com teus dez, onze anos, tinha avançados conhecimentos de Geografia e Zoologia... Algo atípico para uma criança da época -- e, por que não?, de ainda hoje...

O doutorado está do outro lado. Percebe? É. Do outro lado. Terás de submeter-se aos Trabalhos de Hércules que o levarão até esse outro lado, Homem. Terás de mostrar-se proficiente quanto aos mandos e desmandos da Academia. Para, detendo essa parcela de Poder (concretizada na figura do Diploma de Doutor), seguir com aquele Projeto de Vida que visa trazer Diamantes Humanos para brilharem na transformação do mundo. Para reconfigurar o Social. Isso tem custos altos à tua tranquilidade. Tira teu sono. Ser livre pensador, sem reconhecimento da Academia, não leva muito longe.

E sabe o que eu te digo, sabe? Busque cimento, não reconhecimento. Porque, se o segundo é incerto, é com o primeiro que se edifica tua morada junto aos teus.

Os teus Projetos vão-se amontoando. Estás a trilhar teus caminhos. vês: trabalho de formiguinha. Vês? Tijolo por tijolo. Precisas de um Retorno ao Passado. Buscar aquela agulha dourada no palheiro, Homem. É. Sob a luz da Lua Cheia, numa noite espantosa e de rara beleza. Onde a Escuridão cobre o mundo. E as esperanças dançam. Na corda bamba dos dias de futuro passado. Queres um lenço de cetim sobre a sepultura do teu passado para embalar teus sonhos que renascerão em berço de luz. O que tu pedes -- é possível? Não? Só você poderá dizer.