OS LEPROSOS DE SALVADOR (Ou: “ame sua vida tacanha”)

16 de janeiro de 2018

05:58

Você têm nojo do leproso..., mas você nem sabe o que é um leproso, não é mesmo? Nunca viu um. A pior perda do leproso não são seus membros, sua pele... mas sim a sua IDENTIDADE.

Viver numa cidade pequena às vezes é muito complicado, eu sei... você lida com pessoas de forma direta, você as conhece... conviver é difícil. Porém... viver na cidade grande me passa - hoje em dia... - uma sensação de inutilidade. Às vezes a gente anseia o anonimato... sem parar pra pensar que; vivendo em anonimato nada do que a gente faz importa... nada faz sentido.

O grande gigante, a grande máquina... a grande metrópole seguirá o seu curso sem você. Não importa o que você seja, o que você faça, não importa que nomeiem uma rua ou uma ponte com o seu nome; quando você morrer na metrópole... a metrópole esquecerá de você.

Na verdade as pessoas não querem nem mesmo que você fique doente. E não importa que doença seja, não importa em qual hospital “pra-lá-de-chique” você vai se "hospedar", meu amigo... você rapidamente SERÁ, SIM um leproso. Um inútil, um improdutivo, um marginal... todos são tratados como mortos. “Eu?! Um indigente??? Depois de tudo que eu FIZ????” ... parece loucura?! O tempo, junto ao egocentrismo e a apatia da população, a pressão do dia a dia..., e o nosso tão estimado “ANONIMATO” darão cabo de transformar qualquer médico, advogado, professor, manda-chuva, político de toda e qualquer ordem e poder: num pedacinho barato de carne preta/branca e anônima. E não precisa necessariamente falecer pra morrer. Basta você ser I-N-U-T-I-L.

06:10

Já me perguntaram o que eu gosto daqui (Lençóis, BA). Geralmente acham estranho, diante de um lugar rodeado de trilhas e cachoeiras, rios... imensidão de fauna, flora etc... Eu dizer que não gosto de NADA dessas coisas.

O que mais gosto daqui... é poder caminhar pelo centro da cidade cumprimentando e sendo cumprimentado pelas pessoas. Elas sabem meu nome, elas sabem o que faço... elas conhecem e simpatizam com minha energia, e isso é fantástico. Para quem cresceu na cidade isso é quase surreal e maravilhoso. Até dois anos atrás eu era apenas: "o filho de.", "o funcionário de.", "um dos alunos da turma tal.”, “o morador do apartamento 201.”...

06:34

Quando descobri que tinha diabetes, em 2014, passei oito dias internado no hospital Português, em Salvador. Quando saí e voltei pra faculdade... quase ninguém tinha notado minha ausência. Nem mesmo meus amigos perceberam que eu estava internado. Eu lembro de ir falando com as pessoas com aquela expectativa (de terem sentido a minha falta) ... e nada. Nada, nada, nada.

Era eu internado... e sendo um cadáver pro mundo lá fora.

E depois saindo do hospital eufórico como um leproso curado... afoito... correndo atrás de não sei nem o quê.