"MORIBUNDO NA FÉ"

Cadê as obras? cadê as obras?

mas eu tenho cá, a fé e tu tens aí, as obras!

mas eis que, morto, encontro-me, então!

se, da mesma forma a qual,

o corpo, sem espírito, vida não tem, morto, eis que está,

e, assim sendo, a fé, sem as obras,

como o corpo sem o espírito, faz-se,

estou eu morto! mortíssimo, pois não?

pois sim, estou!

cadê as minhas obras?

cadê as minhas obras, ó Deus, ai Deus?

Deus o sabe porquanto, tudo, sabe!

e eu não o sei? ah, que eu sei!

disso, ai que eu também sei!

posso não saber como Ele o sabe,

mas eu sei! sei o suficiente

pra não ficar só indagando

sobre onde é que estão as obras minhas,

com presença de fé e ausência das obras!

poetiza, poetiza, homem!

escreve, escreve, relata, relata,

narra, narra, cita, cita,

copia, copia, transcreve, transcreve!

isto não define obras! não conceitua obras!

não demonstra e não mostra obras!

não as gera, não as apresenta e não as vem parir!

isto não é obras, não faz-se obras!

queres ter fé, porém, morto?

fiques morto, então!

permaneças moribundo na fé,

seu besta! verás para onde é que irás!

obstinado incorrigível!