Desabafo - Bater não é educar
Cresci ouvindo dos meus pais que tomar surra é uma forma de amor e educação, que é assim que um adulto de bom caráter é formado. A verdade é que as surras que tomei jamais mudaram minha percepção sobre as coisas, mesmo criança já tinha opiniões formadas, gostos, vontades. Dobrar o que gostaria de fazer porque meus pais não queriam que o fizesse, me surrando não mudava isso, não se controla o pensamento de alguém.
Apanhei várias vezes, não consigo esquecer uma surra quando tinha menos de cinco que levei do meu pai, óbvio que da dor física não lembro, mas recordo da sensação de medo, terror, vejo-me lançado na cama, chorando muito, enquanto soluçava por causa das pancadas que levei porque respondi grosseiramente para minha mãe. Um menino de quatro anos respondeu de maneira grosseira para a mãe.
Depois de dias e de um remorso enorme, minha mãe que conta, ele pediu desculpas, eu não lembro disso, por ter se excedido. Minha genitora também diz que várias vezes me bateu porque sentia raiva, não do que eu aprontava, mas do trabalho e outros problemas da vida adulta, bater em mim era sua válvula de escape.
Apesar dos remorsos dos meus pais, levei outras surras que marcaram a minha alma, que me deixaram sensações que até hoje, percebo,
preciso lidar, já que agora sou pai de um lindo garotinho de um aninho. Na minha cabeça de recém-pai, rezo o mantra de nunca usar violência contra o meu filho, pois entendo que crianças também têm vontades, personalidades, jeitos etc.
Elas têm vida própria, meu filho é meu amor, mas não é meu, a vida é dele. Estarei aqui para ajudá-lo, mas jamais para querer que ela seja minha extensão, continuidade, isso é ego.
Das surras que levei, apenas aprendi o quanto a alma humana pode ser cruel em nome do amor, que amor, hein? Ontem ouvia o filho do vizinho se desculpando por alguma coisa enquanto o pai o ameaçava. Que raios de educação a violência física causará senão a perpetuação de mais violência.
Eu prefiro criar meu filho consciente do outro, do respeito, do afeto,
a olhar no outro um pouco de si, afinal, não é isso que somos? Uma soma de família, amigos, sociedade etc.
Bater não é educar, educar é gastar tempo, melhor, é aproveitar tempo com o filho. É triste conviver em meio a uma sociedade que cultiva a hipocrisia. O quanto erramos e pedimos misericórdia, seja a Deus, ao chefe, a pessoas, queremos o bem para nós, mas para os filhos a surra, a pancada, o chicote, o medo, o terror, achamos que assim o educaremos.
Finalizo reafirmando, mais uma vez, que bater não é educar, é tornar um ser lindo que é a criança, em um futuro monstro que poderá usar a violência para alcançar seus objetivos, afinal, ela foi ensinado a dobrar a vontade alheia por meio da surra.