VERDADE E MENTIRA SEGUNDO NIETZSCHE

Raramente nos damos conta do quanto o fundamento de qualquer verdade é sempre uma não verdade. O dizer verdadeiro é aquele que se inventa através de conceitos, este curioso artificio para dizer as coisas como elas devem ser na ignorância de suas diferenças. A sombra do Nietzsche de Sobre a verdade e a mentira no sentido extra moral, cabe dizer que tomamos a simbolização enunciativa do real como o próprio real, adivinhando, assim, uma ordem nas coisas. Nietzsche define a verdade neste breve texto de 1873 da seguinte maneira :

“O que é, pois, a verdade?

Um exercício móvel de metáforas, metonímias, antropomorfismos, numa palavra, uma soma de relações humanas que foram realçadas poética e retoricamente, transpostas e adornadas, e que, após uma longa utilização, parecem a um povo consolidadas, canônicas e obrigatórias: as verdades são ilusões das quais se esqueceu que elas assim o são, metáforas que se tornaram desgastadas e sem força sensível, moedas que perderam seu troquel e agora são levadas em conta apenas como metal, e não mais como moedas.”

A verdade é a obrigação de mentir socialmente através das convenções consolidadas, é também uma inconsciência das metáforas intuitivas originais. Assim, ela é essencial ao espírito gregário e a vida em rebanho. Afinal, a verdade tornou-se a principal lei da legislação da linguagem depois que o intelecto, este artificio essencial a sobrevivência dos seres menos favorecidos, inventou a dissimulação como uma necessidade vital. Assim, através dele, a própria linguagem se converteu em um artificio, em dissimulação consagrando a ilusão do verdadeiro e do falso, uma arma, um mecanismo normativo e, portanto, de controle.

Longe da soberba do homem racional e sua leviana história universal, vivemos melhor quando reinventamos nossos jogos de linguagem como exercícios metafóricos, quando através da intuição afirmamos a vida subjetivando a existência como obra de arte.