Esquizofrenia da Palavra I
As janelas do real se abriam algumas vezes. Em certos momentos de uma única vez. Em outros vagarosamente. Havia tempos que não se via nem um fio de luz que despontasse da janela ao se abrir.
A escuridão parecia ser eterna. Ele temia que um dia ele se encerrasse para sempre. Então temendo este dia, queria deixar algo para o mundo da luz, aquele de fora de onde a mesma vinha.
Ele entendia aquelas pessoas, sabia agradá-las e conhecê-las. Mas sabia que um dia a janela se fecharia eternamente. Então se pôs a compor a última obra, não poderia ser qualquer uma, mas uma que fizessem as pessoas lembrarem que naquele lugar havia vivido alguém.
Mas era possível que tudo se perdesse antes que alguém o percebesse. As ideias e palavras resistiam como escritas borradas no papel, que se tornariam como manchas dissolvidas pouco a pouco na água. E tudo se tornando papel, mancha, matéria e escuridão novamente.
A solidão embargou então as palavras, como uma representação aproximada da morte, porém era a própria solidão disfarçada de morte representada pelas palavras. Um alívio momentâneo.
Era impossível representar a morte, embora a própria morte fosse mais real e possível do que qualquer palavra e significado que se pense ou crie. Era impossível parar a morte com as palavras, porém impossível saber-se vivo sem saber dizer-se.
A vida vem com a palavra. O que havia antes da palavra não sabemos se seria como a vida como conseguimos dizer. Porém a morte pode ser dita e só pode ser dita antes que ela se consuma, mas a palavra antecede a morte: a coisa e a palavra estariam separadas por abismos imensos, transponíveis talvez pela religião e outras formas de crenças que buscam se emancipar da palavra.