Curitiba, 09 de abril de 2018.

Cada pessoa que passa pela minha vida não se torna especial à toa, aos poucos me conquista e deixa sua marca ali. Às vezes são necessários anos inteiros para suportar um único minuto, acredite quando lhe digo. Talvez você não saiba que mora em meu coração porque apesar de ser amiga das palavras, quando se trata de expor meus verdadeiros sentimentos, há uma trava interior que me impede de agir com a franqueza que me compete.
Tentar me decifrar de maneira linear é embarcar numa viagem sem volta. Sou feita de retornos, de retalhos, de remorsos, de desejos insaciáveis, de perguntas sem respostas. Sou como a lua, marcada por fases e elas são as responsáveis por nortearem o meu viver, estou sempre a buscar inspiração naquela garotinha cheia de esperança que um dia fui para conseguir suportar a realidade que hoje não possui mais cores vivas e sim tonalidades pálidas, quase apagadas nas muralhas que cercam meu coração.
Dificilmente alguém será capaz de compreender que sinto a necessidade de me recolher de vez em quando porque preciso me entender com o meu coração. Presumo que não haja um lugar onde possa me encaixar neste exato instante, é como se uma borracha gigante atrás de mim apagasse todas as minhas alegrias, meus rastros e me aprisionasse diante desse precipício cinzento.
A depressão diz "sim" e a vida diz "não".
Altos e baixos. Muitos. Incontáveis. Sonhos onde sonho que estou sonhando que a realidade tem cores e esse sorriso sorri de verdade, não é apenas um conveniente disfarce para a ruína interior porque da mesma maneira que pessoas especiais partem meu coração indo embora da minha vida, outras me destroçam ou me destroçaram sem se importarem em como me deixariam e crescer é isso, tentar lidar com as coisas sem ter a quem recorrer, sem poder confiar em ninguém, porque me parece pouco provável que alguém conseguiria entender o que me motiva a escrever agora.
Estou prestes a ingressar numa nova década da minha vida em poucos meses e não estou preparada para lidar com ela porque, sinto desapontar a todos, mas não cumpri nada daquilo que a sociedade julgou que eu deveria ser e fazer quando atingisse essa idade.
Não sei não chorar quando sou obrigada a dizer adeus a alguém de quem gostava muito, ou mesmo engolir as lágrimas por muito tempo, meus olhos me traem, o queixo treme, os dentes rangem, um calor muito conhecido sobe o rosto e esquenta toda a minha alma. É o calor da dor. Por isso não repare se meu olhar estiver perdido no horizonte, estou apenas tentando me encontrar, me refazer, ressignificar vários pontos que estou questionando.
Ainda espero sentir de volta aquela paz que tanto me faz falta. Trocaria toda a década dos 20 e poucos anos para reviver aquela época que apenas quem viveu poderia entender quão marcante ela foi, engoliria sem pestanejar aquela pílula vermelha para voltar aos meus nove anos com aquela sabedoria que a vida me trouxe e aproveitar o gosto daquele pirulito de banana com chocolate que não existe mais, as simplicidades de uma infância que embora tenha sido simples nem por isso foi infeliz, as músicas maravilhosas que mesmo já não sejam mais sucessos pararam no tempo (ao contrário de mim), aqueles tempos em que as pessoas eram mais reais e não saíam brigando com os outros por causa de política, onde havia mais respeito e tolerância, onde criança gostava de ser criança, porque até hoje cerro os olhos e rememoro os momentos agradáveis no playground do prédio onde minha falecida avó paterna morava, aquele frio na barriga amor nenhum nesse mundo nunca me despertou. O que eu não faria para reviver aquele tempo bom onde eu não sabia o que era ter o coração partido, amar alguém que nunca poderá me amar da mesma forma, em que me sentava à mesa para comer sem me preocupar com as calorias dos pratos porque o prazer proporcionado era mais que a angústia em não me adequar aos padrões de beleza e ideais de corpos perfeitos porque eu não me sentia menor que as outras por não estar nos conformes, eu gostava de ser quem era, algumas pessoas não, mas eu gostava, e gostava muito.
E se eu revivesse os anos mais doces da minha vida, com certeza teria seguido meu coração. Não sei se evitar meus erros consertaria alguns furos grotescos na minha história, capítulos que eu jamais gostaria de reler. Em algumas noites insones, quando busco reconstruir o que sobrou de mim, me ponho a devanear como teria sido se tivesse escolhido o caminho A em vez do B, como teria sido melhor não dizer certas palavras amargas das quais me arrependi assim que terminei de pronunciá-las, cedido a pressões alheias, penso em como gostaria de ter dito a algumas pessoas que elas eram especiais para mim, que eu me importava mais do que poderia demonstrar, que hoje pensar nelas assim tão longe de mim é algo que acaba comigo.
É por essa razão que eu digo que meu coração não é mais meu. Pedacinhos dele estão em posse de cada pessoa que amo e algumas delas estão bem longe dos meus olhos, nem sequer fazem ideia do tesouro que possuem, presumo também (ainda que possa estar equivocada) que muitas tenham essa mesma dificuldade de demonstrar os sentimentos e eu não as repreenderia por isso porque não é fácil dizer "eu te amo", não por birra, por medo de soar piegas, e sim porque às vezes o sentimento de bem querer é tão grande que se houvesse algo maior do que o amor, eu não hesitaria em dizer em voz alta.
Respiro saudade, se é o que você quer saber. De aromas inesquecíveis, de sorrisos que nunca mais verei, de vozes que eu reconheceria a muitos quilômetros de distância, de algumas tardes de primavera às quais até a minha tristeza era contente.
Para a minha infelicidade, a tal pílula vermelha que me faria ter dez anos de novo com a sabedoria que tenho hoje (ainda que com ressalvas) é utopia e minha memória tenta manter viva essa parte de mim que talvez seja tudo que me resta de bom.
Algumas pessoas entraram na minha história sem me avisarem e não importa o tempo nem o pretexto pelos quais tenham permanecido, fizeram uma enorme diferença porque não levo em consideração os minutos contabilizados num relógio imaginário que guia dias e noites, mas as sensações que nem sempre são descritas, momentos que muito possivelmente são gravados na memória e em nenhum lugar mais. 
Então, quando uma pessoa vai embora da minha vida, com ou sem adeus, meu coração não sabe fazer outra coisa senão doer, doer para valer. O preço por amar é um só: que cada pedacinho dele siga adiante com quem deixou de fazer parte da minha rotina, mas não das minhas memórias. 
E tudo o que tenho em mãos são elas, as memórias. Apenas elas e mais nada. Memórias que se projetam nas paredes mais profundas da alma e escorrem pelos olhos em forma de saudade. Sonhos que morreram sem sequer terem espaço para se transformarem em realidade. Sonhos pelos quais não lutei por acreditar que teria todo o tempo do mundo. Sonhos, talvez, imaturos para a ocasião. Sonhos que ainda me pertencem, por mais que eu não saiba o que fazer com eles...
Então, quando tiver a oportunidade de olhar fundo nos olhos de alguém não desvie, permita que esse alguém te veja como você é, segure nas mãos desse alguém e transforme esses instantes em boas lembranças. Ria, chore, compartilhe o que há de melhor em você, deixe que o seu coração seja invadido pelo amor, não desperdice essa chance. Se você não souber o que dizer, ofereça um abraço. Abrace de modo que a outra parte possa sentir que seu gesto é verdadeiro.
Pode ser que daqui a dez anos você ainda sinta todo o poder desse abraço e tenha a capacidade mental de reconstruir cada segundo vivido num dia que nunca poderia ser comum, pois a partir do momento em que passamos a existir dentro do coração de alguém, por mais que queiramos, nada voltará a ser como antes, a transformação decorre nos detalhes, enquanto você e eu somos cativados por (ou estamos cativando) alguém.
Eu não estaria escrevendo esse texto sem expor emoção nele ao pensar que minha vida não faria o menor sentido se algumas pessoas não tivessem entrado nela. Então, aceito sem resignação a dor, pois ao menos ela significa que algum dia, em algum momento no espaço, eu me senti próxima do infinito porque pude sentir o Amor.
Amor de amigo. Amor de irmã. Amor de filha. Amor de fã. Amor de quem nada pede em troca. Amor por Amor. Apenas Amor. Porque nada faz sentido na vida enquanto não se ama verdadeiramente. Antes de desnudar o corpo, o Amor toca com suavidade as almas. Em tantas vertentes, o Amor sempre faz com que mostremos o nosso melhor. Qualquer coisa que mostre o nosso pior lado jamais poderá ser considerada Amor.
Conforta-me, nesse mar de lágrimas, pensar que o Amor é infinito, que nada nem ninguém terá poder para apagar do coração o amor que faz com que ele bata com entusiasmo e foco. Então, as pessoas que foram embora estão longe dos meus olhos, não do coração.


Marisol Luz (Mary)
Enviado por Marisol Luz (Mary) em 01/05/2018
Reeditado em 01/05/2018
Código do texto: T6324432
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