A falácia das falésias.

Falésias é um termo usado para o acidente geográfico causado pela ação erosiva da força do mar quando a água avança sobre os terrenos mais próximos à costa, formando paredões íngremes, encontrados no litoral de quase todo o mundo.

De fato o bater das ondas constante por anos e anos desgastam as planícies em volta das encostas do mar, esses eventos podem ser considerados uma destruição natural por parte do mar, ou de certa maneira ele esculpi aquele amontoado de terra e rocha, dependendo do ponto de vista. Mas a questão é que as falésias nunca tiveram escolha, elas são o que são em razão do que o mar às fizera dela, por causa dessa força incessante que, de segundo à segundo em todo tempo e pra sempre, insiste em moldá-las.

Seria a falésia uma mentira? Ela realmente é essa catástrofe revestida de tudo que as ondas trazem? A água salobra, os restos mortais da vida marítima, a brisa, a tempestade, tudo de ruim e bom que a maré descarrega sobre si? Do que ela é feita? O que ela é? De que serve? além de ponto para pássaros construir seus ninhos, ou para descanso dos leões marinhos? enquanto ela permanece ali imóvel, sendo deteriorada sem escolha alguma.

Quem vê de baixo pra cima pode achar que ela parece uma onipotente parede, de cima pra baixo um temerário despenhadeiro, mas o fato é que a as falésias são talvez uma grande falácia, confeccionada e configurada por uma força maior, e não por ela mesma, assim como nós. Se fizermos uma analogia e pressupormos uma realidade onde nós pessoas somos tais quais as falésias e essa força destrutiva do mar, que também podemos fazer uma alusão a vida, é plausível chegar a conclusão de que somos uma mentira.

Quantas vezes você realmente se lembra de ter escolhido algo, que não fosse empurrado goela à baixo pela vida? Imposto por alguma regra ilusória do seu âmbito social e que você fosse obrigado a seguir? Quantas vezes você já se olhou no espelho e não conseguiu saber quem realmente é? Quantas vezes se perguntou qual a causa de sua existência? Ou até mesmo o porque de você ser quem você é? Você já parou pra pensar que nunca escolheu nada disso? E que quando escolhe, não passa de um fruto inconsciente da vida que leva? Ou seja, suas escolhas são resultados do meio social em que vive e você não tem noção nenhuma disso, você não passa de um mísero molde, um estereótipo que se adequa a tudo, ou a algo que faz parte de tudo.

As águas da vida te invadem à todo tempo e a todo instante, trazendo o que quer que seja e levando o que quer que seja, esculpindo suas rochas, lapidando suas bordas, recortando suas rebarbas e te dando acabamento. Você continua inerte, imóvel assim como a falésia, na ilusão de se movimentar, na ilusão de que é dono de suas escolhas, sendo devastado, construído e desconstruído pela força das ondas que batem, e se chocam contra você gradualmente, enquanto você contínua ali sendo transformado, servindo apenas de barreira, a mercê da maré.

O fato é que o ser humano sempre precisou de muletas, nós precisamos nos apoiar em algo, seja pra encarar a realidade ou pra fugir dela, talvez seja pra ignorar esse vazio que nunca se preenche, ignorar essa mentira, de que somos alguma coisa se não as vicissitudes da vida, essa mentira mascarada de verdade, essa falácia. Todos nós temos nossas muletas, seja a religião, a família, os amigos, o trabalho, os nosso sonhos, e ideais, até mesmo as festas e drogas, enfim, qualquer coisa que sirva de apoio para continuar, seguir em frente ou para fugir, esquecer, mesmo que seja por um momento, da falta de tudo que somos, ou pra acender uma réstia de esperança em nós, de que somos algo a mais, não apenas isso, esse acidente vago, ocasionado por alguma força maior, que não de nós mesmo.

Mas chegou a hora de caminharmos com nossas próprias pernas! De decidir por nós mesmos, e já que nossas escolhas são frutos de algo construído previamente antes de nós, e de tudo que derramam sobre a gente, é hora de nos desconstruirmos, voltar para o marco zero, torna-se neutro, esquecer todos os paradigmas que já nos foram postos como verdade, pra daí, a parti disso, termos a certeza de que seremos o que quisemos ser, seguir nosso próprio caminho.

Chegou a hora de olhar pra cara lavada do mar e dizer: - hoje você não vai me invadir!

Chegou a hora de devolver às águas, tudo que elas fizeram de nós! E quando o primeiro cascalho escorregar do alto de nós e a primeira rocha desacoplar-se do nosso peito, quando o mar ouvir o crocito de socorro dos pássaros, que teve seus ninhos jogados fora junto com nossas pedras de lá de cima, nesse momento o mar irá temer a nossa ira e terá a certeza que, dessa vez a falésia é quem vai invadi-lo.

Desmoronar-se em direção as águas, é hora de soterrar a praia!

É hora de devolver à vida tudo que não pedimos, soterrar nossos medos, nossa ignorância, desconstruir conceitos, se desfazer em pedaços, jogar fora nossas crenças limitantes, se auto destruir. Chegou a hora de abdicar-se de nós mesmos, de renunciar a nossa causa, de abjurar nossas convicções e transcende-las, de buscar nosso valor intrínseco. Chegou a hora das falésias irem à ruína, desmoronarem ou se tornarem um abismo, mas agora, por escolha própria!

David Wanes
Enviado por David Wanes em 15/04/2018
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