Banalização da vida
Sabe, às vezes, a gente passa tão batido nessa vida. O poder olhar, andar, respirar passam a ser coisas, extremamente, banais. Ter água para beber. Ter o que comer. Ter entes queridos ao nosso redor. Tais pontos mencionados acabam sendo vistos como normais e, por conseguinte, não possuem credibilidade.
Nesses tempos da hipervalorização dos bens materiais, nos esquecemos dos mínimos detalhes imprescindíveis à sobrevivência. Acontece que, hoje, vivemos uma inversão de valores: crescente descartabilidade das vidas afetivas e grande espaço dado às futilidades. O que nos é imposto, a cada dia, é que necessitamos da renovação do nosso guarda-roupa, do nosso estilo musical, dos nossos aparelhos eletrônicos, a chamada indústria cultural criada por Adorno e Horkheimer. E, assim, é observada a contínua e desmedida substituição da verdadeira valia de uma obra de arte, a qual passa a ser mera mercadoria vendida a cada esquina. É como se todos esses apegos às coisas, literalmente, garantissem a nossa existência. Somos marionetes do capitalismo.
Todo excesso do olhar apurado ao ser inanimado nos cega. Manifestamos nossa revolta e indignação, ao sofrermos um ato de violência, todavia não notamos que a gente, sempre, a estimulou. Na realidade, praticamente, institucionalizamos a violência. Todo santo dia, dissemina-se a ideia da agressão entre as pessoas, seja física, moral e/ou psicológica, por meio dos veículos de comunicação de maior acesso pela população. O homem torna-se um bicho mais próximo à selvageria que à civilização propriamente dita. Contraditório, não? E a luta de todos contra todos é perpetuada, com base nos interesses políticos e econômicos.
Mas, no final, o sapato de marca não me dá o gás oxigênio, tampouco o alimento diário. O celular não me faz companhia, quando estou triste, quando clamo por um abraço consolador e por quem seque as minhas lágrimas, dizendo que tudo ficará bem. O notebook da Apple não assegura a minha visão e me faz enxergar o que me cerca. Na verdade, o que importa não está no material, mas na vida. Está nos corações, na sensibilidade, na valorização de cada um dos sentidos que o indivíduo detém por natureza. Sentidos no seu significado mais amplo possível: desde a visão, o tato, o paladar, a audição, o poder andar até à solidariedade, empatia e capacidade de amar.
A gente precisa manter a prática da alteridade cotidianamente. Nada criado será levado para outra dimensão, a não ser o seu espírito. A melhor revolução se inicia dentro de nós mesmos e, posteriormente, reflete-se na humanidade e no seu bem-estar adquirido. Só dessa forma, teremos uma sociedade melhor.