Slow dance
O mistério e uma sexta-feira à noite. A intangibilidade, apesar do paradoxo, parece habitar cada átomo de existência. Noite dessas ouvi um gemido baixo, agudo, mas, distante. Não ventava e o escuro parado aprofundava cada nota daquele som que a cada vez mais parecia um berro. Urrava doído e último o som, em vibrações que poderiam ser de nascimento ou morte. Coração disparado. Minava pelos poros o cheiro úmido e terroso de uma casa abandonada. Se aproximava o gemido. Sentia gelado e pesado no centro do peito. Alfa ao contrário. Quis correr. Não era possível qualquer movimento. Pensei na gente, enquanto explodia em meu ouvido um grito tenebroso e cortante ao que uma garra de realidade me resgatou. Acordado. Inquieto, via então via uma luz amarela entrando pela janela. Fico pensando que nada faz sentido ao final de um dia. Apegado por um triz de sexta-feira, esse mistério soturno não se esvai, somente a mocidade, o encontro, isso tudo sem remédio, um mistério disfarçado de espera.