Segredo por definição

Enquanto eu deixava a sala, resmungado a estupidez de tal afirmação e a maior ainda de tal discussão, me vem à cabeça o argumento que acabaria com aquilo e me faria vencer a discussão, o que no fim das contas é o único motivo para tal ação e não o “estar certo”, apesar de muitos à isso negarem.

Sempre tentei ser o mais honesto possível comigo mesmo e com os outros e por esse motivo não hesitei em voltar a sala e fazê-la se render à sua própria incoerência.

- Você finge tanto se importar ... parece até rotina... mas o que você realmente quer são essas emoções... de plástico, essas coisas de papel... frágeis, quebradiças. A falsidade das relações. Você ta tão infestada nessa ignorância que nem percebe a realidade diante disso. - Eu concluí ferozmente, uma fala que jamais deveria ser dita neste contexto, verdadeiros segredos por definição.

Ela caiu em prantos, ajoelhando no tapete rasteiro apoiando seus cotovelos na mesa de vidro do centro da sala enquanto suas mãos sofridamente suportavam o peso das lagrimas que tentava esconder.

Pensei em como nunca tinha a visto chorar, quem diria desta maneira. Foi o choro mais sincero que eu já presenciei e minha reação foi cruzar os braços e desviar o olhar do momento, como um garoto se envergonha, como um pai se arrepende, como uma alma foge ao corpo que não consegue suportar.

Sentei no sofá e lhe ofereci um copo d’agua meio cheio que estava por perto enquanto nos aproximávamos do silencio. Seus olhos não desviaram o olhar, ao receber o copo, como eu esperava de alguém com raiva do que ouvira segundos atrás. Então ela disse, o que me traria um gosto amargo da vitória ainda não presente, o que me deixaria arrependido futuramente, o que faria com que eu desmoronasse internamente como ela, que não conseguiu se conter.

- As vezes - disse ela ainda soluçando - precisamos dessas falsas emoções, ... de interações por interações, ... de nada ... por ... tudo. - Ela não sabia bem o que disse ou como o disse, mas o fez do jeito mais sincero e da única maneira que conseguiu conceber uma resposta.

Percebi então, e ali e apenas ali me caiu o peso do arrependimento, de que ela, como muitos outros e como eu, precisamos em alguns momentos de certas mentiras, precisamos da conversa jogada fora e de que a honestidade e a verdade por completas são difíceis de suportar. Para além disso precisamos também de pessoas que atuem neste teatro, que satisfaçam essas vontades da existência, para a ela suportar.

Estava aí o peso em minha consciência, da sinceridade completa e da vaidade, causado pela falta do primeiro por completo nos outros para com os outros e consigo mesmos, a falha da reciprocidade, e pelo segundo que além de mover o primeiro algumas vezes é também o princípio do erro.

O insuportável ato de descobrir por outra pessoa a sua mais funda fraqueza e a incoerência que todos carregam consigo mesmos, é por si só errôneo e indigno, algo que nunca deveria acontecer.