Rabiscado a lápis

Muitas vezes repeti a mim mesma que não me importava com o que pensavam a meu respeito, que lidava bem com meus próprios medos. A estratégia de defesa visava escapar de um inoportuno sofrimento.

Quem nunca tentou?

Quem nunca precisou ser forte?

Sem olhar para trás, disse adeus e ninguém me respondeu, ninguém sentia a minha ausência.

Cansada de ser julgada, difamada, maltratada.

Cansada de ser o melhor que cabia ser e não bastar.

Cansada de implorar pelo amor alheio e estar sempre em último plano.

Cansada de entrar na vida dos outros “tarde demais”, de ser lembrada por dar um ombro amigo nas adversidades e em contrapartida aprender a chorar sozinha.

Cansada de ser apenas mais um número em muitas contas.

Cansada de mim.

O fardo era maior que a resistência. Ainda assim, segui. Impus-me a um ritmo mais lento, apenas desejava chegar a algum lugar, encontrar um cantinho confortável para permanecer o maior tempo que pudesse, sem levar minhas culpas junto, fruto de escolhas impensadas, impulsivas, originadas em um profundo sentimento de carência.

Eu precisava de mim mesma.

Ao meu lado um caderno e dúvidas à parte. Rabisco à lápis para não ter medo de corrigir.

Faz parte do jogo.

Eis que falei sobre você, inadvertidamente, tentando não deixar claro que tudo mudou antes que pudesse haver rendição ou qualquer gesto semelhante.

Não sobrou tempo.

O caminho era aquele.

Era você.

A presença que me preenchia.

A ausência que secretamente eu dava pela falta.

Um nítido verso reescrito para caber dentro de um tímido olhar.

Depois de tudo.

Logo após jurar que manteria distância de problemas.

Pois bem, havia um inconveniente, uma curva. Eu não podia controlar a velocidade com que os pensamentos se propagaram. Não tive o mínimo de chance para dizer não.

Sempre foi sim.

Foi você.

Em negrito ou sublinhado para reforçar a importância.

Sei lá.

Desordenando os parágrafos, remontando teorias, desmontando outras, disfarçando o pulsar de um coração partido com as responsabilidades, dividindo minha dor com um público que não conhece o seu nome, mas tem ciência da sua relevância nas linhas tortas as quais o dom se aprimora, seja para passar despercebido ou não, seja para nunca te entregar o meu coração, embora não me reste outra alternativa a não ser colocar em pratos limpos, com franqueza aceitar ou pelo menos mentir um pouquinho mais dizendo que confio nas artimanhas do destino e pacientemente me servir de mais esperança, nem que seja para seguir fisicamente viva.

Quem nunca desejou apagar essa encruzilhada?

Respostas, meu reino por apenas uma.

Preciso aprender a perguntar.

Nas minhas notas mentais lembrar-me sem falta de mandar o orgulho se catar e parar de bancar o sabido.

E escrever uma nova história se preciso for. O final feliz é opcional. Se há final, feliz não é.

A alegria é urgente e imediata, o amanhã tem preocupação e ela não divide espaço com mais ninguém.

Sim ou sim, ela admira os determinados, mas anseia pela coragem dos desavisados e vibra na direção dos indecisos para que eles deixem de sê-lo ou abram uma pequena concessão para que não percam o senso de humor.

Depois de te conhecer, meus versos não querem fazer sentido, querem a chance de existirem.

É esse o caminho.

Tragá-los.

À revelia.

Sem amarras.

Inflados.

Recortados.

Recontados.

Discordáveis.

Subentendidos.

Intimamente universais.

Secretos por serem seus, sensíveis sem perderem a conexão com a inspiração.

Equivalentes ao beijo de amor que ainda não ganhei, mas o vento soprou e trouxe-me a saudade de um sonho que não sei se foi ou algum dia será a minha realidade.

30 de outubro de 2014.

Marisol Luz (Mary)
Enviado por Marisol Luz (Mary) em 30/10/2017
Código do texto: T6156971
Classificação de conteúdo: seguro