(a)mar

O tempo está correndo mais depressa e por pouco não perdi a hora de novo, obrigada por guardar um espaço para mim neste assento e por ser você.

Sou assim mesmo, desajeitada, ansiosa e intensa. Nem todos que se sentam ao meu lado compreendem o meu jeito de sentir as coisas, então está tudo bem, porque eu estou bem com relação a isso, aprendi a viver para mim e não para eles.

Tudo bem se você quiser segurar minha mão por entre as suas, aprecio o gesto, o calor da sua alma acalenta a minha. Uma viagem sempre se torna mais agradável quando estamos acompanhados de alguém que deseja a nossa presença mais do que tudo.

Porque eu desejo a sua muito antes de crer que seria possível...

É preciso me valer da precaução. Aos poucos gosto mais de você mais do que jamais imaginei, no entanto os olhos ainda não revelam o fulgor, a cautela o encobre para que meu riso se mantenha vivo e eu tenha a chance de refletir sem soar tendenciosa.

Isso se chama sensatez!

Não escondo de ninguém o quanto amo o mar, posso me perder no quebrar de ondas desse infinito azul e recobrar as forças quando quem pede silêncio é Minh ‘alma, todavia mergulhar é uma atitude que demanda certa coragem porque uma vez dentro da água, as chances de me afogar são inevitáveis.

Posso colocar pé ante pé na areia molhada e avançar com a consciência de que ir até o fundo é seguro. A ação naturalmente gerará uma consequência, boa ou ruim. Discernir significa que eu respondo por mim.

Uma vez dentro do mar, o destino é incerto!

O fingimento é um dom natural do ser humano e da mesma forma que eu me apresento indiferente a fim de me proteger da chuva de verão que chega de repente, é breve, mas deixa rastros de destruição mesmo depois que o sol volta a brilhar.

Pois sim, eu realmente gosto de você e não escondo minha franqueza com relação ao medo de ser um sonho efêmero e se esfumaçar numa realidade sisuda.

Você é empática e concorda comigo que minha metáfora não visou enfeitar o texto. Sei que seu entendimento lúcido e maduro sobre as coisas foi um dos motivos que me ajudaram a te enxergar no meio do caos de um ciclo em construção.

Essa moça risonha que te escreve custou a recuperar o seu dom de contar histórias e ver graça nas pequenas coisas. Por um bom tempo, quem diria, o riso se calou e à beira do precipício esteve, tão próxima de se reduzir literalmente ao pó.

Assim me encontrei numa noite de julho há dois anos. Afogada. Mergulhei em ondas perigosas e sobrevivi por milagre.

Sabe, aquele que me levou até o fundo do mar me prometeu que não me deixaria só, contudo me abandonou na chuva e mesmo sabendo que cometeu uma grande covardia, jamais calculou os danos dessa em mim.

Por isso acredite em mim quando eu te afirmo que existe um antes e depois, tão nítido quanto as faixas brancas na estrada cheia de espinhos. A dor de pisar neles nem se comparava a um coração partido.

Eis que são feridas duras na alma. Que ardem tanto quanto uma fogueira acesa e destroem as pilhas de lenha até não restar uma cinza sequer.

O céu era dessa cor, meus versos tinham em si um aspecto sorumbático e repetitivo.

Eu era cinza.

Totalmente cinza.

Resumida a nada.

Minhas feridas deixaram-me exposta, invitaram os burburinhos da minha face oculta, aquela que os bons modos encobrem com distinção.

Sabe aquele sofrimento pelo qual você está passando e tem noção de que ninguém jamais poderá te ajudar?

Ninguém poderia!

Aquela dor pertencia a mim e tudo que dizia respeito a ela. Era de extrema importância enfrentar aquilo com tudo o que restava de mim (e era tão pouco que cabia numa simples lágrima).

Sabe, derrubei uma cordilheira de pranto por quem não moveu nem um dedo para contê-lo. O peito rugiu de desespero. Ninguém por mim senão Deus. E a culpa. O remorso. A rejeição. Ser indiferente foi o meu artifício para me fortalecer sozinha. Aprender aos poucos a conviver com os cacos de uma história na qual minha participação foi boicotada.

Não me importar?

Um notável sinônimo!

Hoje tenho a forma de uma rocha. Pelo menos vista de longe, molhada pelas ondas. Sobrou muito pouco da inocência, então me contento em admirar a beleza do mar a certa distância, tomando cuidado para não me afogar outra vez.

Marisol Luz (Mary)
Enviado por Marisol Luz (Mary) em 28/10/2017
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