Aos homens da Terra

Aos homens de humor inquebrantável! Que trazem no rosto o bom riso mesmo moribundo, sem, com isso, tornar a vida um fardo a ser expiado. Que podem se alegrar com múltiplas alegrias! Ouve minhas palavras como o orvalho de uma nova aurora do homem. Eu vos tenho a dizer para não negais a dor, afim de se libertarem dela, mas, antes, enraizarem, criarem raízes profundas no solo da Terra, para que quando descer-lhe o caos do céu, e os raios da consciência moral, vós possa segurar em si mesmos, como uma árvore que verga numa tempestade mas não cai.

Não vos deixeis transviar pelos encantos do sedativo moral, mais conhecidos por "religião" "ciência" e "verdade". O primeiro signo vem do mal. Não porque exista o mal na natureza, mas o mal que criam por oposição à natureza; o segundo é o espírito da sensualidade, da embriaguez da busca, no fundo uma evolução do primeiro, mais sincero, porém, ainda não sincero ao ponto de voltar os olhos para si mesmo como um objeto de avaliação; o terceiro, é a busca do segundo.

Por que e para que só a verdade, sempre última? A verdade tem mais valor que a ilusão? Qual critério de avaliação?

Eu vos pergunto, não é a verdade uma mulher? E a sensualidade, a aparência, sua principal arma de sedução, e o amor sua religião? A "verdade" é feminina. E os homens de ciência pouco entendem de mulher.

Aqueles que de pés de barro, que não julgue nem de bem, nem de mal as obras dos homens celestes. Pelo contrário, ajudai-vos e aconselhai-vos a seguirem para o além. Estamos para além de bem e mal. A vida nos fala no ar, nas flores, nas plantas, no céu, no próprio corpo, em toda natureza. Ouvimos numa outra linguagem a realidade. É o corpo que nos fala, e nos rege. É a multiplicidade regida pelo antagonismo das forças cósmicas que nos coloca em ação.

Viremos a face para a coroa do sol e nos afastemos das coisas transcendentais, e dos homens celestes!

A Terra contou-me, num meio-dia de um dia páscoa, um segredo que alegrou-me o espírito dividido entre o Céu e a Terra: - disse-me assim: as árvores que almejam o céu sem afundar suas raízes na terra não podem tocar a eira das coisas mais altas. As maiores e mais frondosas árvores tiveram que penetrar fundo nas telúricas sombras da terra, para que viessem a alcançar os picos mais altos e o ar mais puro.

Entretanto, cuidai-vos de que não se deixem sensualizar-se pelas alturas. É para a Terra que vós tendes de querer ser grande. Vosso desejo pelas coisas divinas é vosso desprezo pela Terra, é a vingança contra tudo que em ti é natural, indomável. Não pensais que afirmando a Terra estejais livres do tempo. A eternidade estagnou em sua letargia. O além passou a ser o próprio homem, aqui e agora. A eternidade está aqui, companheiros. Em pleno movimento. Se ainda vos fere os ouvidos minhas palavras, é porque vosso coração saudoso ainda tem lembranças da antiga Terra. Do tempo em que o fardo era dividido ou extirpado por deuses...

Amai-vos o homem como outrora amavam os homens a deus. É nosso o mais pesado dos pesos, e a libertação de toda religiosidade sobre a Terra. Pés de barro, companheiros, assim quer a sabedoria cósmica da imanência...

Fiódor
Enviado por Fiódor em 25/09/2017
Código do texto: T6124478
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