POR QUE ME AMO

Se algo se constrói do nada eu reconheço aqui a insuficiência do meu conhecimento para me pronunciar acerca disso, mas se algo se reconstrói de escombros, se algo se refaz do que não se fez e se algo recomeça de um fim, isso eu reconheço, afirmo e reafirmo, porque “isso” sou eu, e por isso é que eu me amo.

Eu me amo pelos quadros isolados, por todo o conjunto da obra e pela humildade de reconhecer a beleza do que em mim ainda está inacabado. Uma beleza tão singular... Não é linda. Não sou linda... Apenas sou bela, e por isso me amo. Sei reconhecer uma pessoa independente do gênero, quando é linda, mas só a admiro quando ela o sabe ser. E me amo porque encontrei admiração nisso, em aprender a distinguir mesmo quando não me considero inclusa, vou assim dizer, classe.

Eu não me amo só quando sinto que estou sendo amada... Amar é causa, ser amada é consequência... E foi não machucando as flores que fui percebendo e esmiuçando a beleza de cada ato, onde o belo habitou em mim. Esse meu amor veio das minhas escolhas do meu livre arbítrio, quando por exemplo, eu quis matar de raiva e optei por matar a raiva em mim. Posteriormente o que ou quem eu quis matar, por fim acabou morrendo ou adoecendo, e com as mãos que quis ferir, cuidei.

Cheguei ao ponto de certa vez me pegar pulando formigas. Mas essa “loucura” veio bem depois da minha decisão de não abandonar nas matas ou estradas deste inverno, quatro bichanos abandonados para mim. Se os tais serezinhos possuem uma alma ou não, eu não desejo também abordar esta questão. Mas, eu só sei que isso que dizem que nós os seres humanos temos, chamado de alma, olhou para o olhar de um ser não humano, e optou de novo por não desumanizar. Esta alma em mim conseguiu exercer empatia por seres não humanos, mas que acredita serem divinos. Talvez isso explique...

Depois de todo o aprendizado que tive com as lições que a vida escolheu por desenvolver na minha linha do tempo, creio que o principal motivo pelo o qual eu me amo é por me considerar livre. Livre mas nem sempre liberta, por ainda conter muitas amarras em mim. Sou livre para reconhecer sem peso na minha consciência que em mim habita a amarra da hipocrisia, fato este, que não me torna liberta da mesma. A minha alma exerce empatia com bichanos e seres não humanos que vivem próximos a mim, mas eu como carne. Quem me livra disso? Simples, eu. Mas, não quero. Por tanto sou livre para aceitar o julgamento, mas aqui também sou liberta da amarra de não querer julgar. Por isso termino esta pauta porque o intuito aqui não foi o de provocar o escândalo, até mesmo porque o amor não escandaliza, mas muitas vezes constrange.

Eu me amor porque não sou de fazer guerras, sou de fazer a paz, que só se torna possível depois que guerreio as guerras em mim, e as venço. Eu não sei fazer a guerra, mas sei ser ela quando preciso. Aliás, foram dos escombros de muitas delas que me refiz. Refiz-me, e ainda não sou, estou sendo e só serei de fato quando o inacabado que há em mim, se unir à plenitude de tudo e de todas as coisas.

Eu me amo por todos os que não me amaram e pelos que diziam amar, mas que foram levados pelo vento, juntamente com o vazio de suas palavras. Foram duras, mas valiosas as lições de fazer na prática e tornar concreto, quando o que se apresentaram foram ferramentas abstratas, e um pouco pior do que isso, inexistentes também. Porque o fato de algo ser abstrato, não implica necessariamente o dever de ser inexistente. Pode ser abstrato e perfeitamente existir. Mas, muitas vezes não foi esse o meu caso.

Enfim, eu me amo porque aprendi as lições que me foram dadas, o que não quer dizer que passei em todas logo de cara. Repeti muitas delas... Me amo pelo fato de mesmo ter passado e aprendido, me considerar uma iniciante, pronta ou não, a continuar aprendendo, porque as lições só acabam quando dormimos por definitivo. Aliás, esta é só mais uma hipótese, pois ainda não adormeci definitivamente para poder afirmar tal teoria com ênfase.

Eu me amo por ser a pessoa que me tornei, que aprendeu a lição de ver nas adversidades e nos problemas, uma oportunidade de mudanças e superação. Nem sempre fui assim, e às vezes ainda esqueço-me de ser assim, mas só esqueço. Porque este amor por mim mesma, até pode ficar por um tempo adormecido, mas nunca esquecido e jamais inacessível. Porque amor que é amor de verdade, jamais morre. E não nego que por me amar assim, hoje até chego a evitar certos contatos que sei que seriam nocivos. Existe uma frase, na verdade parte da letra de uma música do cantor e poeta Sérgio Lopes, e no trecho que fala sobre o amor, ele diz: “Os homens matam o que não podem entender”.

O amor e o perdão são dois sentimentos que devem caminhar de mãos dadas. Fazem bem de todas as maneiras e dificilmente alguma parte (tanto a que ama e perdoa, quanto a que é amada e recebe o perdão) saem prejudicadas. Porém, não se acorda num dia qualquer e se está amando e perdoando nem a nós mesmos e nem aos outros. Amor e perdão se aprendem, e depois de aprendidos, se não são colocados em prática, se transformam em orgulho e vaidade. Aprendi isso e vou vivendo assim, mesmo quando os outros não entendem, e de certa forma até é compensador, pois se uns criticam, outros admiram. Enfim, me amo porque amar, pois a vida e o amor no final, além de sobrepujar tudo, sempre compensa.