Dizer que o Homossexualismo é Moralmente Errado é Preconceito? Discriminação? Homofobia?

A pergunta esbarra no problema de definir o que essas palavras significam. Se definirmos preconceito como "avaliação negativa sobre a natureza de uma pessoa pelo simples facto de esta ser percebida como membro de um grupo. A avaliação negativa sobre a natureza do grupo como um todo"[1], então sim, é um preconceito. Você entende que aquele comportamento é errado, então que as pessoas que pertencem a esse grupo estão tendo um comportamento errado. Mas essa definição não ajuda muito, já que a partir dela poderíamos dizer que, por exemplo, ter uma avaliação negativa de alguém que se identifica como nazista é preconceituosa.

Outra definição é que o preconceito é "uma antipatia baseada numa generalização defeituosa e inflexível"[2], que também seria problemática de ser aplicada ao caso: primeiro, porque considerar um comportamento como moralmente errado não leva necessariamente a uma antipatia com a pessoa. Segundo, porque para considerar aquele julgamento moral como "defeituoso", e, portanto, preconceituoso, a pessoa já teria que partir do pressuposto que é um julgamento errado; portanto, não é uma avaliação neutra.

Uma terceira definição de preconceito seria "uma atitude ou conjunto de atitudes face a um grupo, abrangendo um conjunto de sentimentos negativos (afectos), crenças (estereótipos) e intenções (disposições comportamentais) para agir desfavoravelmente em relação a grupos ou membros de grupos"[3]. Essa definição pode ser parcialmente aplicada aqui, já que pensar que o homossexualismo é pecado pode ser considerado uma forma de ter um sentimento e uma crença negativa em relação àqueles que pertencem a esse grupo, e expor abertamente essa opinião pode ser considerado "agir desfavoravelmente" em relação a eles. O problema é que, mais uma vez, essa é uma definição ampla demais, que pode ser aplicada a outros casos que não são geralmente considerados preconceitos, como sentimentos negativos em relação a nazistas.

Outra: preconceito é “uma atitude negativa em relação a uma pessoa ou um grupo baseada num processo de comparação social no qual o grupo de pertença é tomado como ponto de referência"[4]. De fato, considerar homossexualismo pecado parte do princípio que o "grupo" heterossexual é tomado como ponto de referência, e qualquer coisa além disso é anormal. E falar isso publicamente pode ser considerado uma atitude negativa contra a pessoa. Mas se nós forçamos essa definição às últimas consequências, teríamos outros problemas. A maioria dos homossexuais consideram o sexo consentido o padrão. Então eles são preconceituosos se tiverem uma "atitude negativa" contra estupradores? A maioria também considera o sexo entre adultos o padrão. Então nós somos preconceituosos se rejeitarmos pedófilos? Eu sei que eu estou forçando a barra, mas essa definição pode se aplicar muito bem ao preconceito étnico por exemplo, mas não ao relacionado a questões sexuais. Porque quando se trata de sexo, qualquer pessoa em sã consciência vai entender que há um padrão de normalidade, e que um grupo que foge desse padrão (zoófilos, pedófilos, estupradores, etc.) estão agindo moralmente errado, estão fora do "grupo de pertença" tomado como ponto de referência. A diferença é que alguns são mais "restritos" do que outros no que consideram como a normalidade.

O que fica claro na avaliação dessas definições é que, para considerar aquele que diz que o homossexualismo é moralmente errado como uma pessoa preconceituosa, é preciso definir a palavra "preconceito" de tal forma que faça uma distinção entre preconceito e um julgamento moral. Me parece que quem diz que homossexualismo é pecado não está fazendo um "pré-julgamento" sobre uma pessoa, ela está julgando o ato em si como moralmente errado. Você pode não concordar com tal julgamento, mas não acho que o termo "preconceito" se aplique aqui.

E quando se trata de discriminação? A melhor definição de discriminação que eu encontrei foi "a manifestação concreta de um preconceito contra uma pessoa ou grupo visto como desqualificado, anormal"[5]. Ou seja, é o preconceito transformado em ato. Assim, se considerar a homossexualidade moralmente errado for um preconceito, afirmar isso publicamente é uma discriminação. Se não for, não é. Eu gosto dessa definição porque ela mostra que a discriminação não é qualquer tratamento diferenciado entre um indivíduo e outro. Porque nesse sentido nós sempre vamos ser discriminatórios, sempre vamos tratar as pessoas diferente uma das outras por diversas razões. A discriminação de que tratamos aqui, ao contrário, está profundamente ligada a um preconceito.

O conceito de discriminação por orientação sexual está associado ao de homofobia. Um sentido clássico dessa palavra é o de ódio a homossexuais, mas ela mal é usada nesse sentido agora. Uma definição comum de homofobia usada atualmente é essa: "sistema a partir do qual uma sociedade organiza um tratamento específico segundo a orientação sexual dos indivíduos. A homofobia concede à heterossexualidade o monopólio da normalidade e fomenta, encoraja o desprezo àqueles que se afastam de tal modelo de referência"[6]. De fato, considerar a homossexualidade como moralmente errado se enquadraria nessa definição de homofobia. Assim, alguns falam até em "homofobia indireta", quando uma pessoa ou grupo confirma e mantém certa hegemonia heterosexual, colocando qualquer outra forma de expressão da sexualidade em um lugar de inferioridade, mesmo sem a intenção de ferir de qualquer forma aqueles que têm comportamentos sexuais incomuns. Nesse sentido, se você considera o comportamento homossexual como impróprio, imoral ou anormal, você é homofóbico. Mas não precisa se preocupar. Nessa definição, a Natureza, que só abençoa com a reprodução casais heterossexuais, também é.

[1] PEREIRA, C; VALA, J. Do preconceito à discriminação justificada. In-Mind_Português, 2010, Vol.1, N.º 2-3, 1-13.

[2] ALLPORT, G. The Nature of Prejudice. Cambridge, MA: Addison-Wesley.

[3] JACKSON, J. S.; BROWN, K. T.; KIRBY, D. C. International perspectives on prejudice and racism.

[4] JONES, J. Prejudice and racism. New York: McGraw-Hill.

[5] BORRILLO, D. Pourquoi une Journée mondiale contre l’homophobie? Le Monde, Paris, 17 de maio de 2005.

[6] SILVA, R.; Nardi, H. A construção social e política pela não-discriminação por orientação sexual. Physis - Revista de Saúde Coletiva. Disponível em: <http://www.redalyc.org/articulo.oa?id=400838231015>