O Poema Burguês e o Poema Revolucionário

O Poema Burguês não muda, não se transforma a não ser para continuar sendo ele mesmo. Aquele que herdou o mundo, não vê razões para transformá-lo. Sua poesia reflete isto.

Ele está em eterno parnaso pessoal, cercado de amigos e um pequeno público que compõe seu mundinho. Ele estranha e acha mau gosto o que o contraria, o que relativiza, o que desconstrói, o que anuncia e clama pelo novo.

O Poema Burguês não entende que o sujo, o agressão, a contestação não é algo gratuito. Ele não é capaz de conceber um poema como uma forma de existência e resistência ao que o torna feio e pequeno. O Poema burguês não sabe o que é se reinventar, resistir e construir o belo onde deveria existir ruínas, conformidade e massificação.

O Poema Burguês, no seu auge, era revolucionário, lutava com a nobreza, lutava por liberdade e por igualdade. Falava mesmo em fraternidade. Hoje ele luta pelo bom gosto, pela distinção, por espaços reservados aos apreciadores da boa arte.

O Poema Burguês ri das lambujas jogadas ao povo, da música lobotomizada, das piadas sem graças de apresentadores desonestos. Ao mesmo tempo que ri ele teme, pois ele mesmo não é nada para esta massa senão letras, palavras e sentidos mortos e afetados em demasia. A massa não o respeita, como respeitava no passado.

O Poema Burguês quer um mundo pacífico, com cada um em seu lugar. Ele não sabe como a fome, a discriminação, a miséria inspiram a revolta e solicita seus poetas, seus guerreiros e seus líderes.

O Poema Burguês se acha que o povo foi dividido pela esquerda. Ora este povo se encontra dividido a séculos por sua cor, classe e violência do Estado.

O Poema Burguês enfeita e suaviza as desigualdades com eufemismos, com promessas de salvação em outro mundo, de justiça em outro mundo. Querem o povo como um cordeiro, o chamam de rebanho não é a toa, manso para o abate.

O Poema Burguês sabe que não há como ficar seguro com tanta miséria produzida por aí. Ele sabe que seu mundinho é pequeno, minúsculo, comparado a vida que nasce, luta e cai em combate a todo momento.

O Poema Revolucionário é escrito com sangue da luta diária pela dignidade que nunca vem. É o Poema que se mistura com negros, índios, brancos e qualquer um lute por melhores condições de vida e justiça.

O Poema Revolucionário é aquele que sai da boca do índio expulso de suas terras. É aquele que sai da boca dos que moram em guetos, dos subempregados, dos que foram confundidos pela polícia com marginais, daqueles que não veem seu salário suficiente para sustentar sua família.

O Poema Revolucionário é aquele que sai da boca das mulheres agredidas por seus namorados e maridos. Daquelas que ganham menos que seus colegas na mesma função. Das que são estupradas e violentadas no seu corpo, na sua mente e no seu espírito.

O Poema Revolucionário é aquele cantado pelos negros, quando se sentem discriminados, daqueles que tiveram seus parentes mortos pela ação da polícia, por aqueles que não terão as mesmas oportunidades mesmo sendo capazes.

O Poema Revolucionário é aquele cantado por quem não quer fazer de conta que esta tudo bem, por aqueles que tem sede e fome de justiça, mas neste mundo.

O Poema Revolucionário é aquele que nasce na linha de frente da luta de classes. Poemas feito por homens saídos do mangue, saudoso Chico Science. Poemas feitos por Zumbi dos Palmares. Poema feito por Milton Santos, Josué de Castro, Florestan Fernandes. Feitos por Antônio Conselheiro.

O Poema Revolucionário do Exército Encantado de São Sebastião no Contestado. Da Confederação dos Tamoios com a permissão de Aimberê e Cunhambebe. E por final brindaremos com Frei Caneca:

"Quem bebe da minha 'caneca' tem sede de liberdade!"

Wendel Alves Damasceno
Enviado por Wendel Alves Damasceno em 12/08/2017
Reeditado em 12/08/2017
Código do texto: T6081943
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